01/12/2024

«1640»: Quando a realidade e a lenda se fundem nasce o romance histórico

       Sou licenciada em Filologia Românica e fui 35 anos, professora de Língua e Literatura Portuguesa, procurando transmitir a alguns milhares de alunos a minha paixão por este património riquíssimo, que é a nossa Língua, a mais viva expressão da alma portuguesa, que não deve ser aviltada ou corrompida. Razão pela qual sou, como tantos milhões de utilizadores desse património precioso, visceralmente contra o famigerado Acordo Ortográfico, feito no segredo de um gabinete e à revelia das instituições e organismos próprios e da maioria dos que dela fazem profissão, um abuso intolerável cometido por alguns iluminados cuja motivação não foi seguramente a valorização da Língua Portuguesa. Os artífices do Acordo mostram que não a amam, mas acham-se donos dela, tendo a arrogância de a quererem impor a um povo inteiro e aos restantes países da Lusofonia, sem atender à maravilhosa riqueza das suas variantes, cujos aportes têm enriquecido o português de Portugal, a língua-mãe, de onde partiram todas as que são hoje aqui faladas e escritas. Rendo as minhas homenagens aos países irmãos que se recusaram a assinar esse inqualificável acordo e espero que nunca o venham a fazer; tal como vi, com amarga ironia, que dos três países assinantes, o Brasil, como sempre, voltou atrás, recusando-se a aplicá-lo. Assim, também me espantou que, neste colóquio, que é uma ocasião única para se poder apreciar as variantes tão ricas da portuguesa língua, se tenha imposto essa malfadada uniformização da escrita, que não é outra coisa senão uma canhestra mutilação, a todos os participantes dos países que o recusaram: Não perdem ocasião de impor pela força aquilo que não conseguem com a razão. Recuso o corte das consoantes mudas que podem não se ouvir, mas falam na escrita com a linguagem dos sinais, mostrando-nos a sua origem e diferenciação, nos seus étimos e raízes. Esse (Des)Acordo nem toma em consideração as variantes dialectais do nosso próprio país, onde há zonas em que a mesma palavra se pronuncia com C e noutras é muda. 
       Trabalhar a nossa língua em todos os seus registos é um prazer divino e a maior motivação da minha escrita. «1640», o meu último romance, levou esse exercício mais longe do que me permiti sonhar. Amo este país e a sua cultura por isso só escrevo romances históricos de temática nacional, a partir das histórias daqueles que souberam criar, desenvolver e manusear a nossa língua com infinita mestria e originalidade, de que nós hoje somos fracos herdeiros. Na minha trilogia dos Descobrimentos – O Navegador da Passagem, O Espião de D. João II e O Corsário dos Sete Mares – recorri ao estilo e linguagem dos cronistas dos séculos XV e XVI, em que a língua ainda se encontrava em processo de desenvolvimento, transbordante de criatividade; em D. Sebastião e o Vidente, mas, sobretudo, no «1640», que aqui venho apresentar, pude gozar com toda a plenitude a volúpia da Língua Portuguesa, que atingiu as maiores alturas no século XVII. Ao escolher para guias do leitor, quatro dos seus maiores mestres e cultores, fui forçada a meter-me na pele (ou a meter sob a minha pele) o épico Brás Garcia de Mascarenhas, a poetisa lírica Soror Violante do Céu, o maior prosador ibérico seiscentista D. Francisco Manuel de Melo e o pregador António Vieira, que deslumbrava pelo virtuosismo da expressão. Quatro narrações feitas em 1ª pessoa, que constituíram, para a escritora, um tremendo desafio, mas também um prazer sem limites. 
       O romance está construído como um puzzle ou uma teia de intertextualidades documentais, geográficas, literárias, filosóficas, religiosas, sociais e culturais, para envolver o leitor, de modo a que ele possa sentir o prazer estético da leitura, aprofundando em simultâneo o seu conhecimento da época em que decorre a acção. 
       No século XVI, passada a euforia da grande odisseia dos descobrimentos de outros mundos até então encobertos aos europeus, a crise endémica portuguesa, provocada pelos problemas políticos, económicos e sociais, vai culminar no desastre de Alcácer-Quibir e na posterior anexação de Portugal por Espanha. O romance 1640 reflecte esses tempos de crise e da vida problemática das suas gentes. Sendo obra de ficção, tem como principal objectivo o prazer estético da leitura, por isso o escritor frui de uma liberdade criativa que é negada ao historiador; contudo, enquanto género histórico, o romance exige uma componente de informação e conhecimento da História que o distingue e singulariza em relação a todos os outros tipos de romance. O que, para ser feito com honestidade intelectual e respeito pelo leitor, implica da parte do seu autor um estudo de alguns anos, não só dos factos narrados, mas sobretudo da sua contextualização, nos múltiplos aspectos de cada época e da mentalidade dos seus actantes. 
      O desastre de Alcácer-Quibir (com que termina o romance D. Sebastião e o Vidente), a crise dinástica, a guerra civil e a anexação do reino por Filipe II de Espanha, numa pretensa União Ibérica, são os antecedentes do romance 1640, em que Portugal foi arrastado para os conflitos do Império espanhol, em particular, da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), uma das mais destrutivas da Europa. 
       A fim de alimentar a guerra em várias frentes, Filipe IV de Espanha e o conde-duque de Olivares, fazendo tábua-rasa dos acordos sobre a autonomia de Portugal, esgotaram os seus recursos humanos e materiais, destruindo a economia e esmagando o povo com impostos, que eram aplicados não em benefício dos portugueses mas dos espanhóis, transformando o reino numa das mais pobres províncias da Península Ibérica. 
       Olivares contou com os serviços de funcionários portugueses submissos e interesseiros, como Diogo Soares, em Madrid, e Miguel de Vasconcelos, em Lisboa, os bons alunos do Ministro estrangeiro, que não só obedeceram às suas directrizes, como foram mais longe na imposição de sacrifícios aos seus compatriotas, reduzindo-os à miséria e à fome. Ao estudar a crise social, económica e política de Portugal, nos textos deste período, foi possível estabelecer um paralelismo entre este triunvirato de governantes seiscentistas e a Troika que nos veio governar, em 2011, imposta pelo FMI/instituições europeias, com os seus nefastos resultados. 
       Nestes períodos de crise, Portugal procurou uma panaceia ou incentivo contra o pessimismo e a estagnação do país, na afirmação da sua nacionalidade e identidade colectiva. E nada melhor para valorizar a nação do que atribuir-lhe origens divinas ou tão antigas, que remontassem a um tempo anterior à sua criação, legitimando-a. Assim, como princípio fundador, mais remoto, surge a identificação de Portugal com a Lusitânia e dos portugueses com os Lusos ou Lusitanos, e consequente apropriação do herói Viriato e da sua luta pela autonomia do território, como matriz e origem histórica de Portugal, uma tese veiculada e exaltada pela Literatura, com expressão máxima nos Lusíadas, de Luís de Camões, no século XVI, e no Viriato Trágico, de Brás Garcia Mascarenhas, no XVII. 
       A reforçar essa legitimidade, uma tese posterior vai atribuir origem divina à fundação do reino de Portugal, por D. Afonso Henriques, sacralizada, em 1139, pelo milagre de Ourique, na sua anunciada visão de Cristo crucificado a prometer-lhe a vitória contra os cinco reis mouros. Um milagre que o consagra rei, em pleno campo de batalha, e que será descrito em futuras crónicas, servindo de argumento para a sua legitimação pelo papa. Sobrepondo-se à valorização política dos dois princípios fundadores, coexistiam três crenças messiânicas, que indicavam 1666 como o annus mirabilis: a dos judeus e cristãos-novos para a vinda do seu Messias; a dos sebastianistas para o regresso d’El-Rei Dom Sebastião; e a dos milenários à espera da destruição do Turco e da instauração de um Quinto Império, cristão e universal, que Bandarra mencionava nas suas Trovas. 
       O povo oprimido começou a ansiar pelo regresso do rei D. Sebastião, desaparecido sem deixar rasto no campo de batalha e identificado com o Encoberto das profecias do sapateiro santo. Uma crença que foi crescendo, cada vez mais forte, durante o domínio dos três Filipes, alimentando a esperança do povo português na sua libertação. Padre António Vieira defenderá a deia do Quinto Império, o Império de Cristo, para um período de mil anos, que terá Portugal como guia, quando todos os pagãos, judeus e muçulmanos forem convertidos ao catolicismo, o reino do Deus único e verdadeiro. 
       O romance «1640», apoiado em inúmeras fontes documentais coevas e actuais, procura fazer um retrato verosímil do Portugal seiscentista, dos seus conflitos internos e das suas difíceis relações internacionais, numa luta pela sobrevivência como nação independente. A acção decorre num período de cinquenta anos (1617-1667), riquíssimo em acontecimentos, dramas e personagens. 
       No dia 1 de Dezembro de 1640, os portugueses dos três Estados – povo, clero e nobreza – soltaram o grito de liberdade e tomaram o destino do país nas suas mãos, iniciando uma intensa luta para sair da crise pelos seus próprios meios, num Portugal esgotado e acossado por nações inimigas – a Espanha e as suas aliadas –, mas também pelas «amigas», como a Inglaterra e a França, que impuseram condições esmagadoras em troca da sua ajuda. Tal como nos nossos dias. 
       A estrutura formal da obra foi inspirada na Corte na Aldeia, de Francisco Rodrigues Lobo, que, ao estilo da época barroca e em total sintonia com a intriga, recorre aos Diálogos entre várias personagens que discutem, comentam e problematizam os assuntos mais variados, introduzindo os capítulos narrativos dos sucessos que mais os marcaram, preocuparam ou divertiram. 
       Durante a dominação filipina, os reis e a Corte residiam em Madrid, centro de acção e decisão sobre todos os assuntos do Império Espanhol e das suas relações com o mundo, mas também um lugar privilegiado de criação e promoção de progresso, cultura e entretenimento. Lisboa, a antiga residência da dinastia de Avis, perdeu assim o seu estatuto de Corte régia, transformando-se em mera capital de província. 
       Cansada de correr para Espanha, a mendigar mercês, parte da nobreza de Portugal retirou-se para os seus domínios, no campo, onde fez florescer as «cortes de aldeia», que procuravam imitar, segundo o estatuto e as posses dos seus senhores, as Cortes régias, com mecenato a escritores, músicos e outros artistas. A mais fulgurante, em dimensão e importância, foi a dos duques de Bragança, em Vila Viçosa, cujo cerimonial cortês era idêntico ao de Madrid. 
       Uma mentalidade barroca que, segundo Vitorino Magalhães Godinho, “anseia pelo fausto e pela exibição, nos círculos nobres como nos religiosos – uma religião de exuberância decorativa, aquietando-se nos ritos de subterrâneas inquietações, satisfazendo-se na exterioridade de uma insatisfeita interioridade”. Assim, nas cidades, essa função cultural e intelectual é assumida nos conventos pelas freiras, cultas e de nobre ascendência, alguns célebres quer pelos seus Outeiros (representações teatrais, concertos musicais, saraus de poesia e produção literária), quer pelos escândalos de cariz licencioso das suas religiosas. 
       Na primeira parte do romance, o narrador é o poeta Brás Garcia de Mascarenhas, autor do Viriato Trágico, a grande epopeia seiscentista cujo herói é o pastor dos Montes Hermínios, com a sua luta contra os romanos, que simboliza a revolta dos portugueses contra a ocupação espanhola. Brás é a personagem de maior relevância, embora desconhecida dos portugueses, que pretendi resgatar ao limbo do esquecimento, restituindo-a a um merecido lugar entre os maiores vultos da cultura portuguesa. Nascido em Avô, amante traído, proscrito e aventureiro, Brás vai conduzir o leitor pelo dédalo de sucessos anteriores à Restauração, como as guerras do Brasil contra os holandeses, a sua amizade com António Vieira, as experiências com os índios e a sua complexa vida amorosa. 
       Na segunda parte, guia-o Soror Violante do Céu, desde o convento da Rosa, em Lisboa. Cultora do conceptismo e cultismo, tanto na poesia de temática religiosa como na de cariz secular/erótico. Celebrada pelos seus contemporâneos, como a Décima Musa e a Fénix dos Engenhos Portugueses, dará a conhecer a situação e vida das mulheres de seiscentos, enclausuradas sem vocação nos conventos, algumas desde a infância, uma prisão que, paradoxalmente, era para muitas uma libertação da tirania masculina castradora, permitindo-lhes estudar e exercer os seus talentos de artistas, letradas ou cientistas, o que de outro modo lhes era vedado pelos homens, sob o pretexto de serem intelectualmente inferiores. 
       Na terceira parte, os conflitos de ordem militar serão relatados por D. Francisco Manuel de Melo, o grande prosador e poeta do século. Na prisão da Torre, este Fidalgo de Dom, aparentado com a Casa de Bragança, militar e marinheiro, foi vítima de uma Justiça corrupta (um traço comum às quatro personagens) que o condenou a doze anos de prisão e ao exílio no Brasil. O seu testemunho permite tomar conhecimento da intrincada rede de conspirações, espionagem e traições com que Portugal e D. João IV se debateram para ganhar a liberdade. 
       Na quarta parte, o leitor é levado pelas palavras e reflexões do jesuíta António Vieira, o mais brilhante pensador e pregador de todos os tempos, que o guiará pelos meandros da diplomacia nacional e internacional, em que D. João IV se vai empenhar num dificílimo jogo de custosas alianças, para que Portugal possa recuperar o seu estatuto de nação independente. No cárcere da Inquisição, entre 1663 e 1667, ano em que termina o romance, Padre António Vieira, relembrando a sua vida passada, dará conta dos mais significativos sucessos em que participou até à crise política interna, do reinado de D. Afonso VI. 
       A complexidade do assunto a tratar implicou o estudo de uma infinidade de temas, porque só no cruzamento de saberes se pode alcançar o multifacetado conhecimento de uma época, um trabalho que se arrastou por treze anos de investigação, embora alternando a sua escrita com a da trilogia dos Descobrimentos. 
       1640 é uma data fulcral da nossa História, que mudou o destino da nação, pois, sem a Restauração, Portugal não seria o mesmo e talvez não passássemos hoje de uma pobre província espanhola, a falar um dialecto e a sonhar com a independência, como a Catalunha, cuja revolta ajudou então à nossa libertação. Assim como, sem a Expansão Marítima Portuguesa, ou seja, sem os Descobrimentos portugueses dos séculos XV e XVI, os países da Lusofonia não existiriam como tal, nem falariam a Língua Portuguesa em todos os seus ricos matizes e este Colóquio não teria razão para existir. 
       Deo gratias, por isso não ter acontecido.

30/11/2024

“1640” - efeméride da Restauração

1 de Dezembro de 1640 Leitura do episódio da Restauração da monarquia portuguesa, por Deana Barroqueiro, no seu romance «1640».

18/08/2024

NAVEGADOR DA PASSAGEM - OS CAURIS

Depois das duas viagens de Diogo Cão, Bartolomeu Dias prossegue com a exploração da costa africana, em 1487, para encontrar o cabo (fim) do continente africano e a passagem para o Oceano Índico. Chega ao Congo e toma conhecimento dos cauris, a moeda daquele continente.

19/07/2024

Dois dedos de conversa

Dois dedos de conversa: Rascunhos Secretos 

Deana Barroqueiro vive em Portugal há muitas décadas e acaba de lançar o livro “Rascunhos Secretos»

MALGA DE VINHO POR SIZA VIEIRA

A MALGA DO 3º MILÉNIO (texto integral, com receita) por Deana Barroqueiro
«Na linha morfológica das tigelas e escudelas, com tamanhos e funções variáveis, usadas para cozinhar e no serviço das mesas, distingue-se a “malga”, de tamanho mais reduzido e pouco variável. Com raízes na "magǐda", descrita por Plínio e usada nas libações aos deuses, a malga particulariza-se e individualiza-se, já na Idade Média, tornando-se, a partir do século XIV, num objecto indispensável a qualquer família, também nos lares quinhentistas. 

Surgiu primeiro em barro, depois em “louça”, a cerâmica vidrada, branca ou decorada, importada de Málaga, aparecendo pela primeira vez mencionada como "mallega", num foral da Guarda de 1510, vulgarizando-se posteriormente como “malga”. Com um diâmetro de bordo de 13-15 cm e uma altura de 7-8 cm, a malga destinava-se ao consumo individual do comer e do beber, sem necessidade de talheres. A sua forma de semiesfera ou calota, com pé anelar, era perfeita para se levar à boca, suspensa entre dois dedos ou na concha das mãos, e emborcar o primeiro vinho recolhido directamente do pipo, na adega. 

Ou ainda, quer na reunião familiar à roda da lareira nos tempos de invernia, quer no convívio com os vizinhos, na eira de noites estreladas, ao fim de um dia de trabalho, aninhada no aconchego das mãos, como um tépido seio de mulher, dispensando o garfo e a faca em favor da colher, o utensílio medieval por excelência, se comia a sopa, o ensopado, o creme ou o doce, em amena cavaqueira. Serviu para múltiplas funções, como substituir as salseirinhas e os pratinhos medievais com especiarias, azeitonas ou torresmos, para o café ou as sopas de cavalo cansado, para medir os ingredientes das receitas de biscoitos e bolos, uma tradição que se manteve nas aldeias do interior de Portugal, até há algumas décadas. 

Contudo, a malga vidrada e imaculadamente branca distinguiu-se como um ícone português, sobretudo, na região vitícola dos vinhos verdes, substituindo pichéis e copos, graças à amplitude da sua calota que, na degustação dos seus tintos, permite aspirar-lhes amplamente os aromas e, ao mesmo tempo, apreciar as tonalidades da sua cor quando tingem a tela branca de cerâmica. O triunfo dos vinhos verdes tintos surge, assim, no século XX, com o “vinhão da malga”. 


A malga é, sem dúvida, um dos objectos portugueses mais tradicionais e com uma história de consumo e demanda mais longa, só perdendo importância, no século XVIII, entre a nobreza e a burguesia, devido ao excesso de porcelanas chinesas, símbolo de luxo e estatuto social, trazidas com a Expansão Marítima Portuguesa. No Brasil, para onde foi levada pelos imigrantes (como em muitas outras partes do mundo), veio a sofrer o mesmo desprezo das classes altas, ficando o seu uso reservado ao povo. 

Foi, todavia, reabilitada e de novo apreciada, a partir do século XIX, por intelectuais, artistas e escritores, como Eça de Queirós, que a refere nas suas obras: azeitonas pretas em malga de barro e também tabaco em malga vidrada, em A Cidade e as Serras. Ou Camilo Castelo Branco, em Maria Moisés (Novelas do Minho): «uma farta malga de caldo fumegando por entre uma floresta de couves recheadas de feijões vermelhos». No século XX, tornou-se num valioso artefacto para coleccionadores. 

E foi então que a Pacheca, graças ao seu empenhamento na renovação de tradições antigas e identitárias de Portugal, como nação antiquíssima da Europa, convocou o génio criativo do grande arquitecto Siza Vieira, para a criação de uma “Malga do 3º Milénio”, que alia a tradição antiga à modernidade do estilo, sem corromper ou adulterar a sua natureza, para que os embaixadores portugueses no mundo possam exibir nas suas mesas, aos convidados, um belo e curioso artefacto português com história, fazendo brindes com os melhores vinhos de Portugal.

BROAS DE MEL (Alvaiade -Vila Velha de Ródão) 
Ingredientes: 1 malga de ovos inteiros; 1 malga de azeite; 1 malga mal cheia de açúcar; 3 c. de sopa, bem cheias, de mel; 1 c. de chá de fermento em pó; 1 casca de limão; canela a gosto; cerca de 3 malgas de farinha de trigo. 
Bate-se os ovos inteiros com o azeite, o açúcar, o mel, a casca de limão e a canela e, em seguida, mistura-se a farinha com o fermento. Deita-se a massa (pouco corredia, para não se espalhar demasiado), às colheres de sopa, em tabuleiros untados com azeite e polvilhados de farinha, deixando uma boa margem entre elas. Cozem em forno bem quente, previamente aquecido, até crescerem (cerca de 7 cm. de diâmetro) e ficarem douradas.

Malga de Vinho By Siza Vieira - Beber vinho tinto na malga! Uma tradição...

 
 Voltando à "Malga do 3º Milénio", que eu baptizei e cuja história escrevi, Marc Barros apresenta-a assim na Revista Vinhos (16. 07. 24): 

«O objectivo do promotor do projecto Quinta da Pacheca é destacar a portugalidade do objecto e do consumo de vinho. Tantas e tantas vezes associada ao consumo de vinho verde tinto, especialmente nas tascas e tabernas, a Quinta da Pacheca decidiu reinterpretar a tradicional malga de vinho. Para o efeito, pediu ao arquitecto Siza Vieira para abordar este objecto, de cariz eminentemente etnográfico, dotando-o de um novo design. 

O objectivo é trazer a malga para os tempos modernos e ainda, de acordo com Paulo Pereira, sócio e proprietário da Quinta da Pacheca, destacar “a portugalidade” da malga enquanto utensílio de consumo de vinho, capaz de “estar nas mesas dos melhores restaurantes Michelin”, de ser destacado “nas embaixadas portuguesas espalhadas pelo mundo”, com a vantagem, ainda, de ser “um produto de cerâmica 100% português”. 

A malga desenhada por Siza possui um diâmetro de bordo de aproximadamente 13 centímetros e sete centímetros de altura. Na apresentação da malga, que decorreu na Quinta da Pacheca, Álvaro Siza Vieira destacou que, “não podia fazer mais uma, igual às demais. Pensei, acima de tudo, nos aspectos funcionais, aqueles que permitem segurar bem uma malga. O design baseou-se, pois, na utilidade do objecto”, referiu. Nesse aspecto, a malga destaca-se por ostentar quatro pequenas reentrâncias circulares que permitem maior aderência. 

Para além de pretender oferecer a experiência de beber vinho numa malga no sentido de relevar tradições ancestrais, a componente histórica e secular deste objecto de vários usos foi destacado pela investigadora e autora Deana Barroqueiro, autora da obra em três volumes História dos Paladares. De acordo com esta académica, a malga, ou tigela, é um objecto que chegou aos nossos dias vindo do tempo da presença romana em território ibérico. 

A comprová-lo, a recentíssima descoberta de uma malga em barro, com os restos fossilizados de um pássaro – correspondendo, portanto, a uma oferenda ou sacrifício – em Miróbriga, Santiago do Cacém, pela equipa do historiador e arqueólogo José Carlos Quaresma. 

Esta malga de Siza Vieira pode ser adquirida nos canais de venda da Quinta da Pacheca e em algumas das garrafeiras por 14,95 euros/unidade ou um package com duas malgas, por 29,90 euros.» 

23/06/2024

Camões publica finalmente Os Lusíadas.

Como os meus leitores mostraram uma surpreendente adesão às minhas leituras, aventuro-me a fazer mais alguns destes vídeos caseiros, obra de quem domina mal estas técnicas. Neste excerto de "D.Sebastião e o Vidente", Luís de Camões logra por fim ver a sua epopeia, Os Lusíadas, publicada em letra de imprensa.

14/06/2024

D. Sebastião ouve ler Os Lusíadas.

Este vídeo é mais para ouvir do que para ver, é a leitura do capítulo do meu “D. Sebastião e o Vidente”, em que o Desejado, enquanto se veste, ouve D. Manuel de Portugal, amigo e protector de Luís de Camões, a apresentar-lhe “Os Lusíadas”, para o rei autorizar a publicação e uma tença ao Poeta. Preferi deixar-vos interromper a leitura quando vos apetecer, a cortar o texto que ficava sem sentido. Ficam a conhecer como se vestiam os reis no século XVI.

02/06/2024

Dia 9 de Junho, às 18 horas na Feira do Livro de Lisboa, Praça Amarela - Deana Barroqueiro

Estarei na Praça Amarela (Ed. Presença)
dia 9 de Junho, das 18 às 19 horas 

Como tenho publicado em diversas editoras, as minhas obras estarão espalhadas pelos seguintes expositores:

- Na Praça Amarela, da editora Manuscrito (Presença), estão:
.«O Navegador da Passagem» (nova edição do meu 1º romance sobre a Saga dos Descobrimentos, com as viagens de Bartolomeu Dias, a passagem do Cabo das Tormentas e o "achamento" do Brasil e o reinado tormentoso de D. João II. 
.«Rascunhos Secretos», o  último livro da minha tetralogia sobre este imenso e apaixonante tema. Este livro termina com a viagem de Fernão de Magalhães e cobre outros assuntos de que me faltava tratar. Creio ter coberto o tema dos Descobrimentos com a  profundidade, seriedade e isenção possíveis, embora sem pôr travões à liberdade de criação que me permite o papel de romancista, portanto, autora de obras de ficção, e não de historiadora, que não sou.

- Na VASP,  B27/28,  espero que tenham os 3 volumes da «História dos Paladares»: 
I - Sedução; II - Perdição; e III - Redenção, que receberam o Gourmand Best in the World Awards - Series, 2021-2022, o maior galardão do mundo para uma colecção de livros de Gastronomia. Fui receber este Óscar à Suécia, um prémio mundial que Portugal nunca tinha recebido.
É uma História da Alimentação, Culinária e Gastronomia, contada através de milhares de obras, histórias e personagens de todo o mundo e de todas as épocas, apresentando, no seu conjunto, mais de 760 receitas tradicionais, nacionais e internacionais.

- Na Praça Leya, no expositor da Casa das Letras, devem ter 4 obras:
.O «D. Sebastião e o Vidente», uma nova edição do meu primeiro romance "de grande fôlego" que, em 2006, a Porto Editora me deu a honra de escolher para se lançar no mundo da ficção, com apresentação no Mosteiro dos Jerónimos.
.O «1640»: Restauração de Portugal, aquele que eu considero o meu melhor livro e o mais trabalhoso (levou-me 13 anos a fazer).
.«O Corsário dos Sete Mares-Fernão Mendes Pinto», que foi adaptado ao cinema pelo realizador João Botelho no seu «Peregrinação».
.«O Espião de D. João II - Pêro da Covilhã», o meu 2º romance sobre os Descobrimentos da Índia e do Reino do Preste João, na Etiópia.

- E já nem falo no volume único dos «Contos+ Novos Contos Eróticos do Velho Testamento», da editora Planeta, que talvez encontrem em saldo, porque houve diferentes edições, como Romance da Bíblia e Tentação da Serpente, da ed. falida Ésquilo.

- A foto acima é caseira, tirada pela minha mão, das minhas obras, para quem as desejar conhecer.  Lá faltam os 7 romances da colecção de aventuras e viagens CRUZEIRO DO SUL (esgotados há muito tempo).



05/05/2024

Camões regressa a Lisboa com Os Lusíadas

CAMÕES REGRESSA DA ÍNDIA COM OS LUSÍADAS 

Celebro, hoje, no dia da Língua Portuguesa, tão maltratada e que eu adoro, os 500 anos do nascimento de Luís Vaz de Camões, lendo-vos um capítulo do meu romance "D. Sebastião e o Vidente", em que o Poeta é a personagem principal. 

Ao desembarcar em Lisboa, vindo de Moçambique, Camões encontra a capital devastada pela peste. Julgo ter recriado com verosimilhança aquilo que o Poeta poderia ter visto à sua chegada.

26/01/2024

RASCUNHOS SECRETOS - NOVO ROMANCE DE DEANA BARROQUEIRO

 NAS LIVRARIAS NO DIA 7 DE FEVEREIRO



«Perdoai não vos declarar o meu nome, mas, nos tempos que correm, falar verdade ou apontar vícios aos poderosos pode ser assaz perigoso.» 

O narrador foi testemunha de conspirações, mortes inexplicáveis, intrigas, traições e amores adúlteros ou sacrílegos. Na corte dos três reis que serviu ― D. Afonso V, D. João II e D. Manuel I ―, um navegador e guerreiro anónimo atreve-se, agora que está no ocaso da vida e refugiado em Castela, a publicar o seu diário repleto de segredos obscuros e inconfessáveis. 

Não tentem saber o seu nome, pois foi um mestre a encobrir a sua identidade. Através do que nos relata nestas páginas, contudo, poderão conhecer alguns dos maiores mistérios da era dos Descobrimentos. Começa em 1485 quando, com apenas dez anos, entrou ao serviço da rainha D. Leonor, mais tarde andou pelas Índias e foi (navegou) além da Taprobana. 

O ponto alto da sua narrativa é, todavia, a espantosa viagem à volta do mundo, empreendida por Fernão de Magalhães, seu grande amigo, a quem acompanhou e desejou prestar homenagem e fazer justiça. 

Neste novo romance, Deana Barroqueiro traz-nos uma visão global sobre os séculos XV e XVI, um dos períodos mais violentos e conspirativos, mas também mais animados, cultos e fecundos de Portugal, através dos olhos de alguém que o testemunhou.

PRÉ-VENDA ONLINE: EDITORA MANUSCRITO/PRESENÇA

11/01/2024

Deana Barroqueiro - Refeitório - Antena 1


 ENTREVISTA PARA A ANTENA 1 (RDP) - REFEITÓRIO A entrevista a Deana Barroqueiro feita por Joana Barrios, no seu programa Refeitório, sobre a sua trilogia da História dos Paladares, vencedora de cinco prémios mundiais de Literatura Gastronómica, incluindo o Gourmand Best in the World Awards - Series. Fala-se também de História da Alimentação e de gastronomia portuguesa, das suas "actividades culinárias", e de escrita de romance histórico português. Foi no dia 13 de Janeiro, em que cortaram a parte final, pois nem a entrevistada nem a entrevistadora deram pela passagem do tempo. Mas, podem ouvi-la na íntegra, se tiverem pachorra para isso, AQUI

11/10/2023

Intergalacticrobot: O Navegador da Passagem



CRÍTICA DE ARTUR COELHO 

 Confesso-me apreciador das ficções históricas desta escritora. O que mais seduz é o equilíbrio entre erudição histórica, visão crítica e sentimento de aventura patente nos seus livros. Percebi isso com o monumental Corsário dos Sete Mares, que transforam a Peregrinação de Fernão de Mendes Pinto numa aventura que nos deixa a pensar nas glórias e tragédias das odisseias portuguesas no Oriente. 

 Em O Navegador da Passagem, Deana Barroqueiro leva-nos a conhecer a figura de Bartolomeu Dias, o navegador responsável pelo dobrar do Cabo da Boa Esperança, pisando pela primeira vez o extremo da África e mostrando que era possível navegar da Europa à Índia contornando o continente africano. 

A escritora não se contenta apenas com essa saga, e cria um romance de aventura com sabor amargo, que salta constantemente entre duas das viagens de Dias: o dobrar do Cabo, e a armada da Índia de Pedro Álvares Cabral, que tropeçou no Brasil (um daqueles acasos que dificilmente foi um real acaso). Este constante saltitar entre tempos e espaços torna a leitura um pouco confusa nas primeiras páginas do livro, mas depressa nos habituamos à viagem. E somos mimados com uma extraordinária reconstrução literária da época dos descobrimentos, onde o rigor histórico se cruza com um enorme prazer na visualização desses tempos de antanho. Tanto seguimos pela costa africana, descobrindo S. Tomé, Mina, os reinos do Congo e os povos à altura desconhecidos do que se veio a tornar a África do Sul. E tanto atravessamos o atlântico num longo desvio à carreira da Índia, entre as temiveis calmarias do alto mar, os primeiros contactos com os nativos sul-americanos, e a reconstituição da primeira missa em solo brasileiro. 

A capacidade descritiva da escritora é de um rigor extraordinário, revela um profundo conhecimento da época que retrata, e consegue fazê-lo de forma fluida na narrativa. O livro não foge a uma visão crítica sobre os Descobrimentos. A visão não é dourada, de exaltação de feitos gloriosos. A dureza da vida nas caravelas é retratada de forma impiedosa, e as injustiças da busca pelos lucros da África e oriente são também mostradas sem floreados. A realidade da escravatura, um dos incentivos económicos à expansão portuguesa, é mostrada sem filtros, sendo um dos elementos centrais da narrativa. 

 Estas obras de Deana Barroqueiro são uma excelente forma de meditar sobre a história portuguesa na era dos descobrimentos. Por detrás da aventura literária está o conhecimento histórico, e este tipo de ficções são uma forma prazeirosa de aprofundar o que se sabe sobre a nossa história.

 
: O Navegador da Passagem: Deana Barroqueiro (2023).  O Navegador da Passagem. Queluz de Baixo: Manuscrito. Confesso-me apreciador das ficções históricas desta escrito..

13/08/2023

Deana Barroqueiro na Feira do Livro de Sesimbra

Caros amigos, hoje, domingo, dia 13, às 21.30 h. estarei na Feira do Livro de Sesimbra, na Praça da California, loja 4E, para falar sobre o Navegador da Passagem e a minha restante obra. 

Era bom ter gente gira para conversar. Ando muito fechada em casa e sinto necessidade de ver os meus amigos e leitores, de conviver com eles. 
Se estiverem por perto e sem nada melhor para fazer, apareçam. 
Um grande abraço.

 

25/07/2023

″Os bem-pensantes querem reduzir os Descobrimentos à escravatura, fazendo tábua rasa de tudo o resto″

Entrevista a Deana Barroqueiro para o Diário de Notícias, por Jorge Andrade   25/07/2023

Em 2023, regressou aos escaparates com o romance histórico de reconstituição, Navegador da Passagem, originalmente publicado em 2008. Narrativa que recua ao século XV, à vida e feitos de Bartolomeu Dias. Mote para uma conversa a propósito do "Capitão do Fim" e da sua época.
Franquear a porta da casa da escritora Deana Barroqueiro é enveredar num mundo de artes e artefactos, memórias de viagens e de vida, similar à matéria que a autora entretece nos seus romances históricos de reconstituição. Quinze anos após a publicação do livro Navegador da Passagem, a luso-americana, nascida em 1945 nos Estados Unidos, regressa a uma das suas obras de maior sucesso para nos embrenhar, leitores, nas águas frias de um Atlântico Sul pretérito, o do século XV. Enveredamos num périplo marítimo na senda de Bartolomeu Dias, descobridor da passagem do Cabo da Boa Esperança, elo entre o Atlântico e o Índico. 
"Uma figura praticamente apagada das páginas da História de Portugal, do homem a quem Fernando Pessoa, n"A Mensagem, apelidou de "Capitão do Fim"", como nos recorda a autora de obras como O Espião de D. João II e O Corsário dos Sete Mares - Fernão Mendes Pinto. Licenciada em Filologia Românica, professora de Português aposentada, autora de projetos de teatro e escrita criativa, Deana Barroqueiro também endereça a sua verve a jovens leitores, com uma saga em sete volumes de aventuras escritas à maneira do escritor italiano Emílio Salgari. Presentemente, a escritora tem um livro quase terminado, "uma espécie de prolongamento de O Navegador da Passagem", como nos relata. Um outro título perfila-se, uma "obra que trata dos sucessos da segunda metade do século XVII, sob o ponto vista de um cozinheiro". 
Dos sucessos recentes de Deana Barroqueiro conta-se um dos mais importantes galardões da gastronomia mundial, o Gourmand Best in The World Award, atribuído ao seu tríptico História dos Paladares (Sedução, Perdição, Redenção). 

 O que sentiu quando visitou a África do Sul e esteve próxima do local onde Bartolomeu Dias abriu um novo caminho para as Índias? 

Senti uma enorme emoção, não só no Cabo da Boa Esperança, a que Bartolomeu Dias chamou Cabo das Tormentas, à vista do magnífico promontório, mas também na Aguada do Saldanha (Table Bay), onde foi morto D. Francisco de Almeida, o 1º Vice-Rei da Índia, como ainda no Museu de Bartolomeu Dias, em Mossel Bay, que o navegador nomeou Baía de S. Brás, ao ver a réplica da sua caravela em tamanho real. Foi uma grande viagem cultural/histórica guiada pelo historiador Prof. Dr. João Paulo Oliveira e Costa.
Comoveu-me, estar ali, naquela imensidão, a imaginar como se sentiriam aqueles homens, uns bichos da terra tão pequenos, como disse Camões, metidos numa minúscula caravela, a verem o gigantesco e aterrador promontório, contra o qual se poderiam desfazer, sabendo que tinham achado a passagem entre o Ocidente e o Oriente, unindo as duas metades do mundo, desfazendo mitos e superstições de séculos. 

 Deana Barroqueiro no cabo das Tormentas  ou da Boa Esperança.

Que retrato nos faz de Bartolomeu Dias, um "herói intemporal como "pessoa"", como o descreve ao abrir o seu livro? 

Para criar uma personagem verosímil, recorri ao muito que estudei e conheço da mentalidade e comportamento desses aventureiros, navegadores e espiões, para mostrar como se sentiam, quando tinham merecimento e deviam ser premiados pelos seus serviços, e se viam preteridos, como aconteceu a Bartolomeu Dias, o "Capitão do Fim", como lhe chamou Fernando Pessoa n'A Mensagem. Vi-o como um grande navegador, muito corajoso e leal, com um enorme espírito de sacrifício e grande determinação, capaz de dominar os seus medos para levar a cabo as suas missões, mas, e também, muito amargurado e frustrado. A sua viagem de descobrir foi decerto, para este homem, uma peregrinação interior, uma espécie de viagem iniciática para conhecer os seus limites. É, por isso, exemplar e intemporal.

Em tempos afirmou que o seu livro pode ser visto como uma "metáfora dos portugueses do século XXI". Porquê? 

No vídeo de 2008 a que alude, eu referia-me, por um lado, aos nossos emigrantes, por estar a sair muita gente jovem à procura de melhores condições de emprego e de vida, como vemos agora, quando estamos a perder os portugueses com melhor formação e mais-valia, cuja Educação pagámos todos, mas de cujo trabalho acabam por beneficiar as outras nações. Por outro lado, o livro mostra como o esforço coletivo, a inteligência do povo português e a sua capacidade de adaptação a todas as circunstâncias, mesmo às mais adversas, podem fazer grandes obras, se a isso se propuserem. Mas também mostra como os portugueses com valor e obra importante são muito pouco valorizados no seu próprio país, quer pelos seus concidadãos, quer pelos governantes ou pelos media - naquele tempo, eram os cronistas -, que pouco noticiam as suas obras e êxitos. 

O processo de escrita de um livro traz momentos de angústias e de incertezas. No caso deste Navegador da Passagem que "cabos" teve a Deana Barroqueiro de transpor? 

Em primeiro lugar, a pouca informação que havia sobre Bartolomeu Dias. Depois a própria construção da narrativa que entrelaça a sua viagem de 1487, para a descoberta do cabo (fim) de África, com a viagem da descoberta do Brasil, em 1500, alternando com episódios da sua vida na corte de D. João II e D. Manuel I, assim como algumas memórias de outras viagens que fez.


Em certas passagens do seu livro, despoja a narrativa do heroísmo para se fazer narradora dos padecimentos a bordo das caravelas, as "prisões do mar". Ao revelar-nos estas fraquezas, quer fazer das suas personagens menos heróis e mais homens? 

O herói da Expansão Portuguesa é um herói coletivo, gente anónima, muito semelhante aos nossos emigrantes dos inícios do século XX, que, em condições terríveis e à custa de muito sacrifício, suor, lágrimas e até da própria vida, procuravam um meio para sair da pobreza e ter um futuro melhor, dando o salto para uma aventura nos mares desconhecidos, que acreditavam estar cheios de monstros aterradores, de precipícios onde os barcos se iriam precipitar, ou de sereias que os levariam à loucura e à morte. 
Encontravam, de facto, esses monstros dentro de si mesmos e das caravelas de descobrir, nas calmarias que imobilizavam as Armadas, semanas a fio, e lhes apodreciam a água e os mantimentos; nas doenças como o escorbuto e as pleurisias e pneumonias, ou nos naufrágios, cujos sobreviventes, quando os havia, eram lançados nas praias de terras e continentes desconhecidos, onde acabavam quase sempre mortos de fome e inanição ou às mãos dos povos indígenas. Creio que fui o primeiro escritor português a descrever a vida terrível nestas prisões do mar. 


Para além da óbvia abertura das rotas de navegação ao Índico, contornando África, no que se traduziu para a visão do Mundo e da relação com o Outro, este dobrar do Cabo da Boa Esperança? 

Os Descobrimentos Portugueses - e Espanhóis - com todos os seus defeitos, levaram o conhecimento do Ocidente para o Oriente e vice-versa, fazendo, além disso, a primeira globalização da Época Moderna, que provocou uma espantosa revolução, progresso e trans- formação do mundo, que já não voltou a ser o mesmo, não só a nível das Ciências, mas também das Artes, das Letras, das técnicas e das mentalidades. 
E, acima de tudo, na alimentação e na culinária dos povos contactados, que se enriqueceram com a troca dos produtos (e as receitas dos nossos pratos) que os portugueses levaram da Europa, mas também do Novo Mundo (Brasil), para África e Oriente, e que trouxeram de lá para cá. Portugal estava à frente de todas as nações europeias, no período dos Descobrimentos, com saberes não só teóricos, mas de experiências feitos. Tínhamos os melhores cientistas - geógrafos, astrónomos, cartógrafos, biólogos, físicos [médicos], boticários [farmacêuticos], engenheiros e inventores, construtores de navios, historiadores, letrados, entre outros. 
As suas obras, copiadas pelas nações europeias mais avançadas, desfaziam mitos, superstições e ignorância, consagrados durante toda a Idade Média, abrindo as mentalidades para uma nova era de Conhecimento, apoiado em provas dadas pela experiência de muitos, pela descoberta de mundos e povos desconhecidos, em zonas que se julgavam inabitáveis, pela nova configuração dos continentes, desenhados milha a milha pelos nossos navegadores nas suas cartas de marear, que os espiões estrangeiros procuravam obter a todo o custo.


A bordo seguem quatro escravas da Guiné. Uma delas ganha relevância, a Leonor. Para além da componente histórica, o que nos quer transmitir ao incluir estas mulheres na narrativa? 

Foram um filão fantástico para poder inventar uma história de paixão, dor e remorso, sem falsear a História, mostrando ao mesmo tempo, a prepotência e injustiça que os poderosos exerciam sobre os mais fracos e indefesos, em particular, a desgraçada condição das mulheres, sem direitos que as protegessem, ainda pior sendo escravas. Essas quatro escravas negras foram enviadas por D. João II para serem lançadas nas terras que fossem descobrindo, porque o rei achava que as mulheres teriam mais sucesso do que os homens, nessas terras. Serviram-me para mostrar a parte mais negra dos Descobrimentos, mas também os costumes dos povos africanos desconhecidos dos portugueses de então, que julgo capazes de encantarem também os leitores de agora. O seu livro também nos traça o ambiente das cortes portuguesas do tempo de D. João II e de D. Manuel I, um mundo que além de todas as maravilhas também se fez de disputas, invejas, intrigas... 
 Em todos os meus romances históricos, do século XV ao XVII, procuro estabelecer pontes do Passado para o nosso Presente, mostrar os defeitos, vícios e virtudes que ainda persistem ou que se perderam. Para mim, a escrita é também uma arma e o escritor deve intervir no mundo em que vive, denunciar injustiças, crimes, falsidades e prepotências, combatendo-as com a palavra e não com a violência e a arruaça. 
A corte, no tempo de D. João II e de D. Manuel I era um vespeiro de invejas e intrigas, entre diversas fações, tal como hoje entre os partidos políticos e outros que competem entre si. Então, quem não pertencesse à grande nobreza, nem tivesse padrinhos e protetores poderosos na esfera do poder, nem fortuna para pagar peitas [subornos] não ia longe. Ninguém queria perder os seus privilégios, a nobreza não trabalhava, vivia dos ofícios e cargos atribuídos pelos reis e da exploração e rendas dos vassalos das suas terras e senhorios, de modo que o povo era quem pagava mais impostos e vivia na miséria, daí preferirem emigrar, embarcando na aventura dos Descobrimentos. Parece algo familiar, não acha? 

Bartolomeu Dias mereceu, na época, o reconhecimento que lhe era devido por parte dos dois reis que serviu? 

Bartolomeu Dias foi muito injustiçado por D. João II e D. Manuel I, a quem serviu com a maior lealdade, mesmo sem deles receber recompensa, de que era merecedor, mais do que qualquer outro, incluindo Vasco da Gama. Ele conhecia o seu valor, tinha sonhos e ambições que procurou concretizar contra tudo e contra todos, levando a cabo missões impossíveis, sem que o seu valor e trabalho fossem reconhecidos. 
Deveria ser ele a comandar a armada que completou a rota para a Índia, porque tinha feito a parte mais difícil do caminho, mas, para ser capitão-mor e ter sob as suas ordens outros fidalgos, teria de ser também fidalgo, teria de ter pelo menos o grau de cavaleiro e ele era apenas escudeiro, só podia ser capitão de navio. 
E o que espanta é nunca lhe terem concedido essa mercê, que até era uma recompensa comum para serviços até menos importantes. D. João II deu o título de cavaleiro a Diogo Cão, além de outras recompensas, crendo que ele tinha dobrado o cabo. Bartolomeu Dias não foi recompensado, quando o fez. Só quando morreu em serviço, D. Manuel deu uma tença aos seus dois filhos. 


"Urge fazer as pazes com determinados aspetos do nosso passado", disse a Deana Barroqueiro numa entrevista ao Clarim, em 2016. A que aspetos se referia? 

Têm-se formado, sobretudo nas redes sociais, centenas de pequenos grupos defensores muitas causas, das mais válidas às mais absurdas, a maioria das quais assentam mais em modas e numa ideia do "politicamente correto" do que em verdadeiro estudo e conhecimento dos assuntos, que querem impor violentamente à maioria dos seus concidadãos, algumas com consequências desastrosas, porque, muitas vezes, os políticos, para não perderem votos ou para não "fazerem ondas", deixam-se manipular e implementam certas ideias aberrantes. 
Os direitos das minorias, que toda a minha vida defendi, não podem, contudo, tornar-se ditaduras que vão contra os direitos da maioria. Começam a aparecer grupos e movimentos, que se auto elegeram como os novos "moralizadores" e censuradores vigilantes da sociedade, que já atacam os direitos fundamentais da maioria dos cidadãos. Começaram já a censurar os livros de escritores mortos, que não podem impedir o ato criminoso. 
Mais perigoso ainda é a vontade de reescrever a História, destruir e apagar a memória do passado, o que é o maior absurdo e o maior desastre para a civilização, porque, sem o conhecimento do nosso Passado coletivo, do bom e do mau que se fez ao longo de milénios, teremos um Presente sem memória, em que os mesmos erros se repetirão e seremos incapazes de projetar um Futuro com valores sólidos e estáveis para as próximas gerações. 
Uma das mais desastrosas consequências desses movimentos foi termos perdido a oportunidade de fazer um grande Museu dos Descobrimentos, da Expansão ou como queiram chamar-lhe, um museu nacional para um dos períodos mais ricos da nossa História, porque os bem-pensantes querem reduzir os Descobrimentos à escravatura, fazendo tábua rasa de tudo o resto. É absurdo julgar o Passado de há 500 anos ou de outras épocas, segundo as nossas conceções morais e políticas do século XXI.


14/06/2023

Algarve com a História dos Paladares - Deana Barroqueiro

 

A DRAP Algarve convida-o a "𝐏𝐞𝐫𝐜𝐨𝐫𝐫𝐞𝐫 𝐨 𝐀𝐥𝐠𝐚𝐫𝐯𝐞 𝐚𝐭𝐫𝐚𝐯é𝐬 𝐝𝐚 𝐇𝐢𝐬𝐭ó𝐫𝐢𝐚 𝐝𝐨𝐬 𝐏𝐚𝐥𝐚𝐝𝐚𝐫𝐞𝐬”  com Deana Barroqueiro

 Sexta-feira, 16 de junho, na Delegação do Sotavento da DRAP Algarve

Vamos estar à conversa com... Deana Barroqueiro.

O programa inclui visita às Coleções de Fruteiras do CEAT, pelas 9h30, e visita à exposição “O Posto Agrário de Tavira” no final da sessão. 

Esta é uma organização conjunta da DRAP Algarve com a Associação Internacional de Paremiologia. 

A escritora DEANA BARROQUEIRO recebeu o Gourmand World Cookbook Awards (Séries), – Prémio de melhor livro de culinária do mundo em 2022, com a trilogia “História dos Paladares”. Foi galardoada com 5 prémios mundiais, incluindo o Óscar dos Gourmand World Awards, para a Melhor Série de Livros de Gastronomia do Mundo (entre 227 países), um prémio que nunca tinha sido ganho por Portugal. 

 Da selecção de 62 países, da última fase deste Concurso, os livros arrebataram o ambicionadíssimo prémio mundial GOURMAND BEST IN THE WORLD 2022 – SERIES, vencendo os 11 concorrentes finais nessa categoria. Foi novamente nomeada para o Óscar do Gourmand Best in the World Awards. 

A Associação Internacional de Paremiologia (AIP-IAP) – é uma instituição cultural sem fins lucrativos, única no seu género a nível mundial, acreditada junto da UNESCO como uma Organização Não Governamental (ONG) e que dinamiza o Clube UNESCO de Paremiologia-Tavira (CUP-T).

30/05/2023

Lançamento de O Navegador da Passagem, de Deana Barroqueiro

 El Corte Inglés, no dia 31 de Maio, Quarta-feira, às 18 h

Venho lembrar aos amigos que O Navegador da Passagem, sobre as viagens de Bartolomeu Dias  (achamento do Cabo da Boa Esperança e descobrimento do Brasil, entre outras e sua vida nas cortes de D. João II e D. Manuel), publicado pela Editora Manuscrito/Presença, vai ser apresentado pelo Prof. João Paulo Oliveira e Costa, no El Corte Inglés, no dia 31 de Maio, Quarta-feira, às 18 h, como indica o convite. Ficarei muito feliz se vir muita gente, porque já vos verei com outros olhos (de melhor vista).


23/05/2023

Deana Barroqueiro na Feira do Livro de Lisboa, Domingo 28, às 15 h.

 


Caríssimos amigos, se quiserem conversar comigo, estarei na Feira do Livro, no próximo domingo, dia 28, às 15 h., na Praça da Presença, que fica no lado esquerdo de quem sobe o Parque Eduardo VII, mais ou menos a meio. Forma uma espécie de praça grande, em quadrado, rodeado pelos pavilhões do Grupo Presença. 

O Navegador da Passagem é uma reedição, pela Editora Manuscrito/Presença do meu romance histórico, que foi publicado em 2008 pela Porto Editora, sobre as viagens de Bartolomeu Dias e as cortes de D. João II e D. Manuel.  

Como todos sabem, adoro estar com os leitores na Feira e tenho muitas novidades. 
 Serão muito bem-vindos.





17/05/2023

À venda nas livrarias

Já está à venda nas livrarias "O Navegador da Passagem - Bartolomeu Dias", a reedição do romance de 2008, de Deana Barroqueiro, que conta a saga de quatro mulheres, escravas negras, que foram as pioneiras das viagens de exploração marítima portuguesa, no contexto do descobrimento do cabo da Boa Esperança, do caminho marítimo para a Índia e do Brasil, no meio das intrigas e traições das cortes de D. Afonso V, D. João II e D. Manuel. Editado pela Manuscrito - Grupo Presença

21/11/2022

Gourmand World Cookbook Award - Series 2023

A TRILOGIA DA  HISTÓRIA DOS PALADARES  
( I - Sedução, II - Perdição, e III - Redenção)
Com 760 receitas de época
é a obra portuguesa de Gastronomia com mais prémios mundiais


Acaba de ganhar o
GOURMAND WORLD COOKBOOK AWARD - SERIES 2023
para o 3º volume da História dos Paladares - Redenção
A obra foi galardoada com cinco prémios mundiais!


PRÉMIOS
* Prix International de La Littérature Gastronomique - 2021, pela Académie Internationale de la Gastronomie (Paris) -  Volume I;
* Gourmand World Cookbook Award - Series, 2022 - Volumes I e II
* Gourmand World Cookbook Award - History of Culinary, 2022 - Volumes I e II
* Gourmand World Cookbook Award - Series, 2023 - Volume III
* GOURMAD BEST IN THE WORLD 2022 (o Óscar da Gastronomia Mundial)

25/10/2022

Lançamento da História dos Paladares - Redenção

Lançamento do 3º volume da História dos Paladares - Redenção

 8 de Novembro, 3ª feira,  às 18.30 h
na FNAC - COLOMBO

 A apresentação será feita por VIRGÍLIO NOGUEIRO GOMES (Professor, autor e crítico de Gastronomia) e JOÃO MICAEL (MATRIZ PORTUGUESA - PRÉMIO FEMINA). 

Será a primeira apresentação presencial da trilogia, em Lisboa, devido à Covid. Espero poder contar com a presença dos meus amigos, que já não vejo há 3 anos. Serão recebidos com todo o carinho. Os três volumes estarão à venda na Fnac.

02/08/2022

DOURO - HISTÓRIAS COM PALADARES VÍNICOS (VIAGEM GASTRONÓMICA)

 De 13 a 16  de Outubro 2022

A Tryvel - Groups & Incentives  convida-o para uma viagem gastronómica  inolvidável  DOURO - HISTÓRIAS COM PALADARES VÍNICOS, acompnhada por DEANA  BARROQUEIRO 
Chancela CNC - Centro Nacional de Cultura 
Hotéis 4**** | Pensão Completa 
https://tryvel.pt/tour/douro-com-paladares/
 
A VIAGEM: 
Com a consagrada autora de romances históricos e da obra HISTÓRIA DOS PALADARES, notável vencedora do mais importante prémio mundial para obras de culinária e de literatura gastronómica, os “Gourmand Best in the World Cookbook Awards 2022” (o Óscar da Gastronomia) com os dois primeiros volumes da obra, I - Sedução e 2 - Perdição (galardoados com mais 3 prémios mundiais),  convida-nos, a visitar, como Miguel Torga, esse “Douro sublimado":

O prodígio de uma paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos contemplam: é um excesso da natureza. Socalcos que são passadas de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor, pintor ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis da visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta. (Torga)

ITINERÁRIO:


 A esta explosão de natureza juntaremos histórias com paladares vínicos, contadas por  Deana Barroqueiro, visitas culturais e de enoturismo, com belos repastos e degustação de vinhos, espumantes e iguarias gastronómicas da região, partilhadas por Chefs e Enólogos dos locais que elegemos. 

Teremos ainda, o privilégio, de sermos convidados de honra, na apresentação do 3º Volume da obra História dos Paladares – Redenção, da nossa premiada autora, que terá lugar no Hotel Hilton Porto Gaia, no cais de Gaia, com a presença de personalidades intelectuais e empresariais da região, e da sua editora, Prime Books de Jaime Cancella de Abreu. 

Ficam convidados para mais um projecto cultural com a chancela do CNC – Centro Nacional de Cultura! De registar também que a autora já tinha sido anteriormente agraciada com o Prémio Internacional da Literatura Gastronómica 2021, para o primeiro volume - “Sedução”, pela reputada Académie International de la Gastronomie (Paris), e ainda com o Prémio Femina - Notáveis Mulheres - 2021.

 CONTACTOS e RESERVAS:
 info@tryvel.pt | 936007033 Tryvel - Lisboa | Porto

30/07/2022

Assim vai o mundo editorial português...

 

Sou do tempo em que os editores eram gente culta, amavam os livros, sabiam reconhecer a qualidade onde a viam e se recusavam a publicar más obras, mesmo que os autores fossem "famosos". 

Agora, para a maioria dos editores (felizmente há algumas excepções nesta triste realidade), os livros passaram a ser "produtos", como qualquer detergente ou frango de supermercado, não interessa a qualidade, mas apenas aquilo que os seus vendedores (que nem lêem as obras) acham que interessa ao "mercado", ou seja à maioria esmagadora dos portugueses que não lê sequer um livro por ano. Em particular, se os autores forem gente da TV ou políticos... que lhes fazem a promoção nos Media.

As editoras portuguesas preferem apostar mais no lixo estrangeiro (e também nacional) do que investir na promoção dos livros de qualidade dos escritores nacionais, que são comprados pelos bons leitores, tão descurados também. Por isso assistimos, todos os anos, quer nas Feiras do Livro, quer nos saldos das livrarias, a caixotes a abarrotarem de centenas dessas obras estrangeiras "de cordel " que ninguém compra, num aviltante desperdício de papel, que até faz doer a alma.

A falta de visão dos editores, que não publicam livros mas "produtos" não podia ser mais gritante, quando 6 das principais editoras recusaram publicar a minha História dos Paladares, então com 2 volumes, "por não ser viável" dada a sua extensão e se a quisesse publicar teria de reduzir a obra a 400 páginas, que era o mesmo que matá-la! Recusei, claro, mesmo com o risco óbvio de não a ver publicada. 

Eu ganhei e as editoras perderam!
Os 2 volumes da História dos Paladares foram galardoados de imediato com 4 prémios mundiais, inclisive o da Melhor Série do Mundo da Gastronomia - The Gourmand Best in The World Cookbook Award - Series (o Óscar da Literatura Gastronómica), de entre 227 países e maiis de 1500 obras a concurso! 
E Jaime Cancella de Abreu, da pequena editora Prime Books, que teve visão e publicou não 2 mas 3 volumes, ganhou o prémio do Melhor Editor de Obras de Gastronomia - 2021!