HISTÓRIA DOS PALADARES
I - SEDUÇÃO
LEVANTANDO O VÉU...
Caros Amigos leitores, venho deixar-vos aqui o rascunho das 2 primeiras páginas do Cap. II, para terem uma ideia da estrutura muito fora do comum (louca?) que dei a esta minha obra.
Todos os capítulos têm por títulos não produtos, mas sensações, sempre traduzidas em 3 adjectivos, que ligam o físico, ao psicológico e ao simbólico, que depois são completadas pelos títulos dos paladares, pelos provérbios e pelas histórias e receitas, além de outras coisas que cada leitor achará a seu gosto, e será diferente de qualquer outro, porque, como dizia Fernando Pessoa, «Sentir, sinta quem lê». Atenção que isto é o meu rascunho, não é o livro, que está muito bonito, tanto por fora como por dentro.
Divirtam-se!
CAP. II – LÊVEDOS / FINTOS / ALENTADORES
Paladares míticos: Beleza e formosura nem dão pão nem fartura
Um dos mais belos mitos da Grécia Antiga, posteriormente adoptado pelos romanos, é o da trágica aventura das deusas da agricultura e das sementeiras:
«Perséfone/Proserpina, filha de Zeus/Júpiter e da sua irmã Deméter/Ceres, era o orgulho da mãe e, juntas, tornavam a terra viçosa e fecunda, alimentando a humanidade, que lhes rendia culto por todo o mundo.
Um dia a Virgem da Primavera foi raptada pelo seu próprio tio, Hades/Plutão, o Senhor dos Mundos Subterrâneos, que a levou para o seu palácio, no meio do Tártaro, criando para ela, um jardim cheio de flores e frutos, oásis luminoso num deserto de trevas, onde a convidou a comer as iguarias mais raras, mandadas vir dos quatro cantos do universo para seu prazer. Perséfone recusou, sabendo que se quebrasse o jejum no mundo dos mortos não mais poderia partir.
O sombrio Adamastos (nome dado a Hades, Plutão, que significa indomável, inflexível, dele deriva Adamastor) sentou-se a seu lado sob uma romãzeira carregada de frutos e falou-lhe do seu horrendo trabalho, da sua vida sem amor nem esperança. Como poderia ele ser compassivo e generoso se nunca fora amado? Perséfone, comovida pelo sofrimento e a solidão dos belos olhos negros, aceitou os bagos rubros da romã que ele lhe oferecia, com as mais ternas palavras de amor, selando assim o seu destino.
Durante nove dias e nove noites, sem comer nem dormir, Deméter percorrera a Terra à procura da filha, mas ninguém sabia do seu paradeiro. Desesperada, abandonou o Olimpo e refugiou-se numa cabana, nos confins do mundo, recusando-se a abençoar a terra com as sementes e os frutos, tornando os solos estéreis e condenando a humanidade à fome, miséria e morte.
Vendo a raça humana prestes a extinguir-se, Zeus ordenou ao irmão que deixasse Perséfone voltar para junto da mãe. Forçado a obedecer, Adamastos só sossegou, quando a jovem esposa lhe prometeu que passaria a viver metade do ano com ele, no Mundo dos Mortos, e a outra metade com a mãe, para a ajudar a fecundar a terra e alimentar a Humanidade.
Quando a filha vem viver com ela, Deméter faz eclodir na terra a Primavera e o Verão numa profusão de flores e frutos; porém, logo que Perséfone regressa aos Infernos, a deusa da abundância recolhe-se na sua solidão e o Inverno apodera-se da terra, cobrindo-a com o seu manto de tristeza.
Paladares ancestrais: «Um cheiro salutar e honesto a pão no forno» (Cesário Verde)
Os vários tipos de farinha têm distintos componentes em diferentes proporções, entre amido, açúcares, proteínas, gorduras, sais minerais e água. Quando se junta à farinha um líquido, como água ou leite, as proteínas ligam-se para formar como que uma rede (glúten) forte e elástica, desejável quando fazemos pão ou massa folhada, mas não para bolos, massas de tarte, crepes ou scones, pois ficariam duros. A farinha que se vende com fermento, usada para bolos, tem um baixo conteúdo em proteínas, dificultando a formação desta rede.
O fermento em pó é formado por bicarbonato de sódio (uma base) e um ácido em quantidade suficiente para reagirem entre si, mantendo-se separados e secos graças ao amido que absorve a humidade do ar.
Quando se mistura o fermento com um líquido contendo água dá-se uma reacção química entre o bicarbonato e o ácido e novos produtos se formam. Neste caso, o mais importante é a formação de dióxido de carbono que vai contribuir para tornar os bolos mais leves.
Crê-se que os povos pré-históricos começaram por comer os grãos dos cereais crus ou torrados, demolhados em água ou nas espigas grelhadas. Há mais de dez mil anos, na antiga Mesopotâmia, moíam os grãos com pedras e misturavam o pó com água para formar uma massa que era cozida nas fogueiras ou entre pedras aquecidas, produzindo uma espécie de pão espalmado.
As Tabuletas de Culinária da Mesopotâmia mostram como o pão desempenhava um papel preponderante na dieta suméria, acompanhado de carne picada e outros recheios. Neste tratado em escrita cuneiforme, descreve-se o fabrico de uma massa que permite fazer vários tipos de pão achatado, com diferentes texturas, cozinhado nas paredes de fornos abertos ou fechados, e também em moldes, como o actual khobz tannour do Líbano ou o tabouna da Tunísia. Em outras receitas, aconselha-se a achatar e a esticar a massa para fazer um folhado, a fim de confeccionar uma torta barrada de manteiga e recheada com pássaros, alhos-porros e mel. Desta massa saem o bapiru, um esparguete primitivo, seco e cozinhado em líquido, o ziqqu e o butumtu, semelhantes ao cuscuz e bulgur.
Receita de Pombos em folhado
Os pombos são previamente desossados, de modo que a carne branca e as coxas possam ser tratadas de forma diferente. As carnes brancas são escalfadas em um caldo ou potagem de carneiro, num caldeirão de metal, enquanto as coxas são flamejadas e embrulhadas em massa, cozidas como empada num basallu, o molde próprio, colocado num forno vertical. Quando o prato sai do forno, adicionam-se as outras carnes, as fêveras dos pombos e os pedaços do carneiro.
O basallu desempenha um duplo papel, servindo como um utensílio de cozinha e prato de serviço. A iguaria é decorada com uma salada verde em vinagre.
Paladares faraónicos: Dos cheiros o pão, e dos sabores o sal
Desde 2600 a. C., que os egípcios utilizavam diversos tipos de cereais para fazer farinhas e pães, quando inventaram os fornos de barro. Segundo consta, descobriram o processo da fermentação da mistura de água e farinha, por acidente, quando um padeiro se esqueceu da massa crua junto do forno em que cozia o pão e ao voltar, passadas umas horas, viu que ela inchara, ficando leve e com bolhas; cozeu-a assim mesmo e maravilhou-se com o resultado.
Como o pão de farinha de trigo era de melhor qualidade, tornou-se muito popular e os egípcios experimentavam novos sabores e texturas, adicionando à massa diferentes ingredientes, como mel, ovos, tâmaras, sementes ou condimentos e moldavam-na em forma de pássaros, peixes e outros animais para as festividades.
Ofertas de pão às divindades e no culto dos mortos faziam parte dos rituais da maioria das religiões, pela crença de que o pão era uma dádiva dos deuses ao homem, portanto, sagrado. De início, os gregos compravam-no aos egípcios, a quem chamavam arthophagoi, «comedores de pão», mas não tardaram a imitá-los e, no século III a. C., o padeiro Thearion criou uma cadeia de padarias como estabelecimentos comerciais públicos, prática que os romanos copiaram. Teriam sido os padeiros da Capadócia, os primeiros a adicionar à farinha de trigo um pouco de leite, azeite e sal, obtendo assim um tipo de pão muito suave e delicado. (Paulo Moreiras)
Paladares helénicos: Com pão e vinho, anda-se caminho
No poema Hedypatheia, Arquéstrato atribui ao pão uma importância fundamental e descreve a variedade de pães que os gregos consumiam.
ara saberem mais, terão de esperar pelo livro