Num artigo para um debate sobre o Acordo Ortográfico (AO), no Público de 10 de Março, Vasco Teixeira, administrador e director editorial do Grupo Porto Editora, lamenta que Portugal tivesse adoptado o acordo sem garantir o acompanhamento de Angola e Moçambique. O artigo parece reflectir uma visão economicista e estratégica da Língua Portuguesa em que, embora se fale de “património de valor (quase) incalculável”, se esquece por completo a sua vertente fundamental, que é a cultural.
A propósito das críticas feitas por Angola ao AO, Vasco Teixeira tece algumas considerações que me parecem um tanto ambíguas, na medida em que a sua editora se apressou a adoptar o dito Acordo nos seus manuais escolares e a produzir dicionários com a “nova” grafia (ou língua), muito antes da data oficial para a sua aplicação. Percebe-se a pressa, por razões económicas e de lucro, querendo ser a primeira a pôr os ditos produtos no mercado.
Porém, como Angola e Moçambique, os dois maiores países africanos de Língua Portuguesa não ratificaram o Acordo e escrevem com o português de Portugal, “o tiro parece ter saído pela culatra” aos apressados. Se ambos os países mantiverem a sua posição e continuarem a escrever o português europeu, presumo que as exportações, que devem ser seguramente maiores do que para o Brasil (ou deveriam sê-lo de futuro), vão sofrer muito com este “negócio” da Língua.
E Vasco Teixeira reconhece-o, como se pode ver por estes excertos do seu artigo:
“Estas notícias têm a particularidade de sublinhar a gritante ausência de visão estratégica de quem conduziu o processo do Acordo Ortográfico em Portugal – a reboque de uma eventual harmonização ortográfica com o Brasil, afastámo-nos da África lusófona.
Todos sabemos que a língua portuguesa é um património de valor (quase) incalculável. Infelizmente tendemos a esquecermo-nos da sua efectiva importância económica.
(…) o peso das edições portuguesas nas exportações para aqueles países (Angola e Moçambique) cresceu gradualmente, chegando mesmo a atingir, na primeira década deste século, 1/6 das exportações para Moçambique. Hoje, as principais editoras, com a Porto Editora à cabeça, têm nos maiores países africanos lusófonos importantes investimentos que têm contribuído, por um lado, para o desenvolvimento educacional daqueles países e, por outro, para reforçar os laços culturais e linguísticos com Portugal
Um facto tem de ser constatado: em Angola ou Moçambique não se escreve português como cá (eu diria: “como o que se passou a escrever cá”), o que significa que toda a nossa produção editorial só é exportável para aqueles países se for adaptada à antiga ortografia, com tudo o que isso significa em termos de custos acrescidos. Ou seja, falamos efectivamente a mesma língua, mas escrevêmo-la de forma diferente. Faz sentido?
(…) Não deixa de ser curioso que dependamos dos bons ofícios diplomáticos de Portugal e, em particular, do Brasil para convencer Angola e Moçambique a adoptar o acordo ortográfico e assim preservarmos um património de enorme importância económica e estratégica - a nossa língua.”
Vasco Teixeira quer que Angola e Moçambique ratifiquem o AO para preservar “um património de enorme importância económica e estratégica”.
Eu espero que Angola e Moçambique não o ratifiquem, preservando assim o nosso Património Cultural fundamental, o cerne da nossa identidade, que é a Língua Portuguesa.
A única unificação que me parece útil, senão mesmo necessária, é a terminologia científica, artística, tecnológica, informática e, mesmo assim, evitando os americanismos aberrantes ditados pela aculturação do Brasil, sem qualquer ligação à nossa matriz linguística.
Nota: como não subscrevo o AO, emendei os erros nas citações retiradas do artigo que o Público publicou, a pedido de Vasco Teixeira, no novo português.
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