19/03/2016

D. Sebastião: o rei o mito e a intriga

Esta entrevista para o JL - Jornal de Letras, sobre o D. Sebastião e o Vidente, foi feita oralmente, por telefone. Como falo muito (foi uma longa conversa) e muito depressa, torna-se difícil ao entrevistador captar e recolher o essencial sem truncar algumas frases ou cometer incorrecções. Para quem tiver interesse e pachorra para ler.


A obra de Deana Barroqueira foca-se sobretudo em figuras históricas e na era dos Descobrimentos como Bartolomeu Dias, Pêro da Covilhã ou Fernão Mendes Pinto. No seu romance D. Sebastião e o Vidente, agora reeditado, faz uma abordagem mítica ao reinado de D. Sebastião. A autora, que venceu o Prémio Máxima de Literatura-Prémio Especial do Júri em 2007, também escreveu vários livros de aventuras para jovens, que focavam a História de Portugal.

Jornal de Letras: Quando começou a interessar-se por D. Sebastião?
Deana Barroqueiro: quando andava à procura de figuras da literatura e das ciências. A certa altura, descobri um fidalgo, Miguel Leitão de Andrada, que tinha ido parar a Alcácer Quibir e tinha tido uma fuga rocambolesca. Casou três
vezes e teve uma vida muito acidentada e engraçada. A partir do livro dele tive a percepção de uma personagem fantástica para se fazer um romance. Ao começar a desmontar a época e o tempo, vi que era quatro meses mais velho do que D. Sebastião. Miguel Andrada de Leitão andou muito enredado com o rei e tinham muitos pontos em comum. Perderam os pais muito cedo e vão juntos na ala do aventureiros para Alcácer Quibir. E o irmão mais velho de Leitão de Andrada estava muito próximo do rei e por isso este tem sempre uma percepção muito próxima desta figura histórica.

O que é que esta nova edição revista do seu livro tem de novo?
Simplesmente melhorei o livro em termos de linguagem. O livro teve a primeira edição há 10 anos, quando a Porto Editora se lançou na área da ficção. Não quis modificar a história e mantive a estrutura, que eu concebi à maneira
do século XVI.

Nessa estrutura destaca-se o papel do narrador. É fundamental para perceber este romance?
Quis que fosse. Não é o fundamental, porque nos diálogos e nas situações o leitor percebe a história, mas lança uma constante piscadela de olho. Vai sempre interferindo, pontuando, comentando e fazendo observações acerca do futuro, se será ou não de uma maneira ou de outra. O romance histórico é sempre um manancial de informação, inclusivamente
para os políticos, para não repetirem os erros, mas não é só um livro de história seco, puro e duro.

O objetivo deste livro é entender quem é D. Sebastião?
É tentar entender D. Sebastião como ser humano na sua complexidade através de tudo o que passou nas suas experiências de vida. Dos seus traumas, da forma como foi educado, como foi apaparicado, como ninguém o contrariava quando foi rei absoluto aos 14 anos. E depois todas as intrigas daquele tempo, incluindo os espiões  de D. Filipe II que mexia as peças e governava. A estas, acrescentei a minha: sobre a forma como D. Sebastião ficou doente.

O Vidente ajuda perceber quem é D. Sebastião?
Creio que sim. Ele descreve no seu próprio livro que viu D. Sebastião morto no cavalo. Ele é uma das testemunhas da batalha de Alcácer Quibir. Ele vai comentando sempre, é muito crítico no livro.

Qual foi o período mais importante da vida de D. Sebastião, para perceber a personagem?
Eu acho que é a primeira fase da vida dele até ser rei aos 14 anos. Essa fase raramente é falada, sabe-se que ele perdeu o pai. Mas é importante saber que o próprio Pedro Nunes foi professor dele, que era amante de xadrez, que contraria a ideia que ele era um idiota. A sua generosidade, há muitos relatos de que ele era capaz de oferecer a sua camisa se visse um pobre a pedir esmola. A sua coragem incrível, ele ia na proa dos navios quando havia tempestades. O seu sofrimento, aquela ideia de ser capitão de Deus, formada pela religião e pelos romances de cavalaria. O idealismo que faz dele uma personagem extraordinária no  aspecto de ser humano ou então do mito. Acho que consigo dar a personagem mais próxima do real através de tudo o consegui  ler dele.

Qual o significado de D. Sebastião na História portuguesa?
Não há melhor significado do que o Desejado permanecer na nossa memória colectiva ao longo de 500 anos. O único rei que todos os portugueses conhecem. É o mítico. É muito comum D. Sebastião ser o mais amado ou mais odiado.

JL. Rodrigo Vaz Pinto

Deana Barroqueiro
D. SEBASTIÃO E O VIDENTE
Casa das letras, 692pp , 21,90 euros

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