23/04/2018

Dia do Livro e dos Direitos de Autor

1 - Hoje, às 18 horas, vou estar na Biblioteca da Faculdade de Letras de Lisboa (Metro Cidade Universitária) para uma conversa sobre livros e o romance histórico.
2 - E às 20.20 horas, na Fnac Colombo, vou ler um dos meus textos, durante uma Maratona de Leitura, feita por escritores, que dura das 16 às 21 horas. Vou ler uma passagem de O Corsário dos Sete Mares, um episódio de Fernão Mendes Pinto na China, em casa do monteo, o capitão que vai levar o aventureiro para cumprir pena na Grande Muralha. 
Deixo-vos aqui o seu começo (qualquer semelhança cinematográfica é pura coincidência):

       Como os hóspedes são estrangeiros e os serões se passam dentro de portas, as donas e donzelas da casa não se escondem deles, sendo ouvintes incansáveis das histórias das suas vidas, dos lugares de onde vêm, das viagens que fizeram ou das nações visitadas. É um mundo novo que se abre ante estas mulheres que nunca saíram da cidade porque, para se deslocarem a mais de trinta léguas de suas casas, os chins necessitam de licença dos mandarins, a qual custa caro, nem sempre é concedida ou tarda muito a chegar.
       Vendo o interesse de Fernão por tudo o que o rodeia e também pelos livros que Liu Xugang possui, Zhou, a filha mais velha, faz leituras ao serão da Crónica dos Oitenta Reis da China, das Brochas d’O da Vontade do Filho do Sol (de que ele já ouvira alguns textos ao poeta Lin Dan, o seu companheiro de viagem e de ferros pelo rio Batampina) e da Situação de Todos os Lugares Notáveis do Império da China, respondendo às suas perguntas, uma divertida prática a que se junta o monteo para explicar, com grande gosto e paciência, as partes mais difíceis.
       – Vou cantar-vos um tzu antigo, um poema musical de Fan Tchongyen, para alegrar o vosso exílio – diz-lhes Zhou, certa noite, com o doce sorriso que aquece a alma dos exilados.
       Celebravam o Duplo Sétimo – o sétimo dia do sétimo mês lunar – em que as meninas, para se tornarem talentosas na arte de bordar, fazem ofertas de frutos e de doces à bodhisattva Guaiyn de mil braços, deusa da misericórdia. A gentil moça toma nas mãos cor de neve o erhu, uma espécie de viola de arco de duas cordas, dedilha-o para avaliar o som e canta:
Insidiosa, todas as noites
A saudade persegue
O espírito do peregrino,
Se não o proteger um suave
Sonho, num sono profundo:
A lua cheia – alto Pavilhão solitário –
“Não te encostes ao balcão!..”
E o vinho, no coração despedaçado,
Transforma-se então em lágrimas
Carregadas de mágoas sem fim.
       A sua voz, ao mesmo tempo suave e lastimosa, adoça a alma dos desafortunados estrangeiros, desterrados da pátria e da família. A saudade não mata, mas sepulta o coração em vida, pensa Fernão ao ouvila com um prazer doloroso, como se nela houvesse incarnado o espírito da sua amada Chu Huyen, quando cantava a sua mágoa pela ausência do noivo a quem fora furtada, enchendo-o de paixão e ciúme.
       Acabado o canto, não há um só dos degredados que não tenha os olhos húmidos de lágrimas, por viverem há tanto tempo sem um mimo de mãe, irmã, esposa ou noiva que lhes mitigue o sofrimento. Gaspar de Meireles, cheio de nostalgia, canta-lhes alguns vilancetes, acompanhando-se o melhor que pode com o instrumento chim, em que já tem alguma prática, pelo que todos folgam, aplaudindo muito...


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