26/11/2018

Contos Eróticos do Velho Testamento: Agradecimento

Agradeço à editora Planeta, às  duas apresentadoras - Helena Trindade Lopes e Dulce Garcia - e a todos os amigos que vieram festejar comigo a apresentação desta nova edição dos meus Contos Eróticos do Velho Testamento.

Entrevista na revista «Delas»


Deana Barroqueiro: “O jogo da sensualidade é uma maravilha, melhor do que o truca-truca”
Ana Tomás - revista Delas
Lisboa 06/11/2018 - Entrevista com a escritora Deana Barroqueiro , a propósito do livro Contos Eróticos do Velho Testamento (João Silva/Global Imagens )
O movimento #Metoo fez a reputada escritora de romances históricos, Deana Barroqueiro, recuar 15 anos e decidir recuperar para um mesmo volume ‘Contos Eróticos do Velho Testamento’ e os ‘Novos Contos Eróticos do Velho Testamento’. A nova edição, sob o título único do primeiro (‘Contos Eróticos do Velho Testamento’, com edição da Planeta), foi revista e traz um prefácio da poetiza Maria Teresa Horta. Nestes contos, erotismo e violência alternam, reflectindo a condição das mulheres da época a que reportam as narrativas contidas no Velho Testamento, de onde o livro parte. Desconstroem-se mitos e heróis masculinos e desvendam-se as raízes ancestrais da discriminação das mulheres. Não mudámos assim tanto na forma como, enquanto humanidade, olhamos para a sexualidade e a sua vivência pelos géneros, com brutalidade e vitimização a surgirem frequentemente nas complexas equações do erotismo.
Mas há que ter cuidado com os excessos e com os extremismos, avisa a escritora, de 73 anos, em entrevista ao Delas.pt, a propósito do movimento que contextualiza esta reedição. “Acho que o #Metoo tem de ter cuidado, porque senão qualquer dia estamos castradas como antigamente. Na relação de amor entre homem e mulher, entre dois homens ou duas mulheres, o jogo da sensualidade é uma maravilha, melhor do que o truca-truca”, diz sem papas na língua. Nesta entrevista, a escritora fala também da linguagem poética que usou para amenizar cenas mais violentas a que o texto bíblico faz referência, de como as grandes religiões monoteístas formataram e condicionaram a liberdade e os direitos das mulheres e da sua paixão pela história de Portugal. “Quando dizem muito mal dos Descobrimentos, não sabem nada [do assunto], quando começam a falar, vejo logo que não sabem nada, não leram nada”.

Esta é uma reedição de dois livros num só volume – os ‘Contos Eróticos do Velho Testamento’ e os ‘Novos Contos Eróticos do Velho Testamento’. Por que quis, 15 anos depois, das primeiras edições juntar estes dois livros num só volume?  
Esses dois livros já tiveram várias edições, mas sempre relativamente pequenas. Actualmente, o movimento #Metoo fez-me pensar que há 15 anos eu estava a fazer o meu movimento #Metoo sozinha. Sempre me bati contra qualquer tipo de discriminação, sobretudo a das mulheres. E na minha geração batalhámos muito contra isso. Era preciso trabalhar muito mais para conseguir ficar em pé de igualdade, quer no trabalho, quer noutras situações, com o homem. E há uma coisa que sempre me incomodou: as três principais religiões do Ocidente e do Médio Oriente (o Islamismo, o Judaísmo e o Cristianismo) têm uma concepção da mulher muito castradora, sobretudo em relação ao sexo, em relação às sensações das mulheres, que nos leva até à mutilação genital e a toda a brutalidade a que estão sujeitas as mulheres. E essas três religiões e essas concepções vão buscar a sua génese ao Velho Testamento, sobretudo ao livro de Génesis. São dadas como bom exemplo, mas são histórias de muito mau exemplo, onde os homens aparecem sempre como protegidos de Deus, justos, quando são violentos, dominadores, hipócritas, sempre com o nome de Deus na boca para justificarem as brutalidades que fazem. Têm um terror em relação à mulher e uma necessidade de a dominar. E as mulheres são sempre as culpadas de tudo, desde o Pecado Original, em que o homem se deixou tentar; aparentemente, eles pecam, mas elas é que são as culpadas.
Mas a opção de reunir os dois livros num, deveu-se a quê exactamente? 
Eu já tive uma edição em que os contos apareciam cronologicamente e faziam uma espécie de romance – publicados como ‘Tentação da Serpente’ e o ‘Romance da Bíblia’ –, mas perdiam a estrutura que eu lhes quis dar: no primeiro livro, ‘Os Contos Eróticos do Velho Testamento’ são as histórias das mulheres sofridas, as vítimas, e nos ‘Novos Contos Eróticos do Velho Testamento’ são as mulheres que sobreviviam – sendo, às vezes, mais perversas do que os homens. Portanto, neste livro há de novo esse contraponto entre essas mulheres vítimas e vencedoras.
Neste livro, Deus também é retratado como uma figura temperamental e constantemente frustrada com a sua criação – a humanidade – e daí estar sempre a castigá-la. 
Este Deus do Velho Testamento é um Deus feito à imagem dos homens bárbaros de então.
Não é o Homem que é feito à imagem de Deus? 
Não é Deus que cria o homem. As divindades, os deuses são criados pelos homens. Portanto, este Deus é criado à imagem do homem de há 4000 anos. É um Deus cruel, temperamental, que está sempre a desculpar o homem e a culpar a mulher. Segundo a minha concepção de divindade, Deus não podia ser assim. Tinha de ser um ente absolutamente divino, generoso para todos os seres – se é o Criador como é que despreza tanto a sua própria criação, a destrói, de tal maneira lhe impõe tantos castigos, fazendo vítimas inocentes? É absolutamente arbitrário. Como é que podem dizer que aquele livro é sagrado, quando a maior parte das suas histórias, obviamente, são escritas por homens, a partir dos mitos da Mesopotâmia, do Egipto e outros? Basicamente, o meu livro é um livro de contos históricos. Depois, o elo de ligação é esse erotismo, que perpassa através das histórias do Velho Testamento, porque o erotismo devia ser qualquer coisa de delicioso, mas aqueles homens fanáticos queriam repudiá-lo e é através do castigo das mulheres que isso acontece. Eu tentei recriar as histórias dessas tribos, de acordo com aquilo que conhecemos historicamente, através dos documentos – até li um livro de medicina egípcio de há 3000 anos. Li tudo o que consegui apanhar. Foi escrito com o máximo de realismo que consegui dar, através do olhar de uma espécie de cronista ateu, que se limita a contar as histórias, de um ponto de vista feminino.

Deana Barroqueiro é autora de vários romances históricos. Os contos que agora reedita neste “Contos Eróticos do Velho Testamento” tiveram a sua primeira edição há 15 anos [João Silva/Global Imagens]
Como é que converteu aquilo que, como disse, é um erotismo que perpassa no Velho Testamento, em contos efectivamente eróticos, como mostra este livro? 
Eu queria dar uma visão das mulheres daquele tempo, também do ponto de vista de uma mulher. Poucas mulheres têm tido a coragem de falar sobre a sua sexualidade e da sexualidade feminina. Esta é mais falada por homens, que eu acho que não têm assim tanto conhecimento como nós poderemos ter das nossas sensações. E eu quis tratar dessas sensações. As mulheres têm uma capacidade imaginativa enorme.
Mas, como referiu já nesta entrevista e o seu livro também faz notar, esta é uma obra que também mostra muita violência sexual contra as mulheres e que ainda existe, um pouco por todo o mundo. Como é que no meio dessa violência consegue extrair esse erotismo e, ainda mais, do ponto de vista feminino? 
Eu quis pôr todas as mulheres do Velho Testamento, portanto usei outros textos além do livro do Génesis, como os provérbios em que a mulher é muito mal tratada; e o desafio era não esconder nenhuma daquelas violências, embora trantando-as com uma linguagem que fosse poética. Mostrando a situação, mas sem entrar na pornografia. E nas poucas cenas em que realmente há uma relação saudável – e são pouquíssimas, há o lavrador Boaz que é uma figura normal, simpática, sensível – nessas cenas eu descrevo as sensações com maior poesia. Uso a linguagem poética porque também estão ali as minhas sensações. É através dos olhos das mulheres, mas é através do meu olhar também. As sensações humanas são iguais desde o princípio dos tempos, nós podemos verbalizá-las de maneira mais elegante, mais filosófica ou mais intelectual, mas as nossas sensações são as mesmas desde que a primeira mulher olhou para um barbudo, peludo, meio macaco e o achou sexy. É físico, embora depois o cérebro nos pregue grandes partidas.
Um livro como este terá de ter uma vertente de ficção quase em proporção equivalente com a histórica, ou não?
[Risos] Eu fui um bocadinho perversa. Tenho uma Bíblia muito boa, comentada cientificamente pelos [Frades] Capuchinhos, aproveitei essas explicações científicas para as pôr em situação. Depois imaginei essas mulheres num contexto em que não houvesse milagres. Agora a Igreja diz que é tudo simbólico, mas quando eu era miúda e dei catequese, os padres apresentavam aquelas histórias como se fossem reais. Eu procurei, no primeiro conjunto de contos, perceber como é que aquelas mulheres sofredoras viam aqueles patriarcas, aqueles maridos, aqueles amantes. Portanto, são oito patriarcas vistos por nove mulheres diferentes, cada conto é um olhar feminino. O Abraão tem direito a dois, porque é o ‘cafajeste’ maior, vende Sara duas vezes para se salvar da morte, porque como ela é tão bela tem medo que o matem para que fique viúva. E expulsa Agar para o deserto com o filho. Os segundos contos têm mais a ver com casos clínicos.
Como assim? 
Porque, como é que se explica, se não se acreditar nos milagres, como por exemplo, que uma jovem fica possessa do demónio Asmodeu, que se apaixona por ela? Ora casam a menina com um velho, depois o velho morre na noite de núpcias e ela, pela lei do levirato, é obrigada a casar sucessivamente com outros seis homens da família. Isto é uma violência brutal para uma mulher. Na época actual, como é que se explica que uma jovem possa matar sete maridos e continue virgem? Seria uma histérica-esquizofrénica? Fartei-me de ler casos de psiquiatria, para explicar certos comportamentos aberrantes. Como o de Sansão. Sansão, nos filmes de Hollyood, é aquela figura épica e simpática, no entanto tem uma enorme apetência de matar, vê-se que ele provoca até gente inocente para a matar. Há uma série de casos assim, uma série de vigarices e de enganos, que Deus justifica. Esses Novos Contos já são mais irónicos do que propriamente eróticos, embora também tenham erotismo. No último conto do segundo livro, o da Ester, eu já estava fartíssima de pôr cenas de banhos e outras situações eróticas. A imaginação também tem limites. Então surgiu-me uma ideia salvadora: “esta mulher não se despe”. E o conto tornou-se no mais erótico de todos. São truques que as mulheres fazem e as escritoras também [risos]
Lendo o seu livro, conclui-se que, em muitos casos, a humanidade, ou boa parte dela, não mudou muito a maneira como vê o sexo e a sexualidade da mulher. 
Não. Falando da agressão sexual, que não é só física, mas verbal e psicológica. Quando eu era jovem, e eu tenho 73 anos, não havia piropos, havia obscenidades, raramente se ouvia um piropo, os homens diziam-nos coisas ordinaríssimas. Depois era o apalpar. O objectivo era ofender e humilhar a mulher que não podiam ter.
Directa e com um sentido de humor jovial e desarmante, a escritora e antiga professora de liceu é uma defensora da criação de um museu sobre os descobrimentos, que assuma as barbáries mas também as personagens “fabulosas” da história portuguesa [Fotografia: João Silva/Global Imagens]
Na pesquisa para escrever estes contos eróticos encontrou mulheres ou culturas onde as mulheres fossem de alguma forma empoderadas? 
Sim, havia muitas zonas de África em que a sociedade era matriarcal e elas tinham muita força. A rainha Ginga em Angola, por exemplo, ou noutro contexto as persas e as indianas, antes do domínio do islamismo. Havia sociedades em que se via essa força e importância das mulheres, como guerreiras, estando ao lado dos homens [noutras actividades] que depois se perdem completamente com o islamismo. Quando os muçulmanos, que também dominaram os povos pela violência (e não apenas pelo comércio), ao imporem o islamismo, foram colocando as mulheres nesse segundo ou terceiro plano.
Como é que se escrevem contos eróticos sem confundir erotismo com pornografia, sobretudo, num contexto temporal como o do Velho Testamento? Às vezes, a fronteira pode ser ténue.
É. Há duas ou três cenas que são tórridas, mas a ideia era é essa [diferenciar], porque o erotismo não é pornografia. Por isso eu também acho que o #Metoo tem de ter cuidado, porque senão qualquer dia estamos castradas como antigamente. Na relação de amor entre homem e mulher, ou entre dois homens ou duas mulheres, o jogo da sensualidade é uma maravilha, melhor do que o truca-truca. Como digo aos miúdos, quando vou a uma escola e eles me perguntam sobre isso, truca-truca fazem os bichos, o jogo da sedução, sentir a flor da pele, olhar nos olhos, o toque, o namoro, tudo isso é uma maravilha. Normalmente, os miúdos estão muito obcecados por ir para a cama e perdem todo o jogo da sedução. Antes do 25 de Abril, aqui em Portugal, as mulheres não beijavam homens, toda a gente se beija actualmente. Se for beijar um jovem estou a cometer uma agressão sexual? Não estou, estou a beijá-lo como se ele fosse um filhote ou um neto. Não se pode destruir isso e os exageros, os fundamentalismos, às vezes, são desgraçados, tal como o politicamente correcto.
Mas por vezes há uma confusão de conceitos entre o que é violência sexual, de assédio e depois entre o assédio e a sedução, tal como há entre piropo e obscenidade. Não acha que #Metoo também veio um pouco pôr o dedo na ferida sobre isso e pôr as pessoas a pensar sobre isso? Sim. Qualquer pessoa tem direito a dizer não e o indivíduo tem de parar. Há ocasiões, e as feministas ficam muito furiosas quando se diz que alguém ‘pôs-se a jeito’, mas é um facto, às vezes “pôs-se mesmo a jeito’ e, ao longo dos tempos, a mulher usou a sexualidade e o corpo para subir na vida. Quando olhamos para o cinema americano, ninguém fechou as actrizes numa casa de banho e as violou. Isso é outra coisa. Houve também as que queriam um papel num filme, porque queriam subir na carreira. Como diz a Maria Teresa Horta, nós inauguramos uma era em que se subia na vida pelo talento e trabalho, não de costas numa cama. Dormir com o chefe? Apostava-se o emprego, mas podia-se dizer não. Perdia-se o emprego. Isso é um risco, mas é uma escolha. Quando se calam, quando recebem dinheiro e 30 anos depois é que vão falar disso, guardam os vestidos com sémen e depois dizem que foram violadas, numa ocasião que dê jeito? Eu essas coisas não aceito, porque depois mete-se tudo no mesmo saco e a verdadeira tragédia e a verdadeira canalhice deixa de ter a visibilidade que devia ter. E eu sou visceralmente contra a violação e contra a violência sobre as mulheres.
Nasceu nos Estados Unidos da América, embora tenha vindo para Portugal muito pequena. Acompanha, ainda assim, com especial interesse o que se vai passando lá? 
Sim. Tenho família na América, tenho duas sobrinhas e duas sobrinhas-netas também. E elas são todas activistas, por isso vejo com muito interesse.
As mulheres assumiram, em muitos casos, a dianteira dos protestos contra Donald Trump. A manifestação da Women’s March, pouco depois da tomada de posse como presidente, foi exemplo disso. Nas últimas eleições intercalares, as mulheres também fizeram história… 
Pois, isso é muito importante. A América é feita de contrastes e isso, em certa medida, fascina-me. Trump realmente encarna tudo aquilo que é de mais primário, mais primitivo. Ele lembra-me muito uma figura do Velho Testamento, embora transposto para uma época moderna.
Voltando às religiões. São as únicas responsáveis pela matriz cultural que impõe discriminações ou desigualdades entre os sexos, não há outros motivos? 
Há outros motivos, a própria civilização, a civilização patriarcal, há montes, montes de razões. Mas a religião formatou-nos, durante séculos. Não é Deus, não estou contra um Deus em que as pessoas acreditam. As pessoas precisam de Deus e da religião. É o mau uso da religião feita pelos homens, que eu combato.
O que é que ainda a fascina na história de Portugal? Sobre que mistérios é que gostaria de escrever? 
São tantos, eu não tenho é idade para os fazer todos. Comecei muito tarde, comecei aos 55 anos. A nossa História é riquíssima, puxa-se uma personagem ou um sucesso e vêm atrás outras 50 figuras fabulosas. Eu não sei como é que os portugueses dizem tanto mal de Portugal. Acho que desconhecem o seu próprio país. A ignorância é muito atrevida. Quando dizem mal dos Descobrimentos, a maioria dos críticos desconhece esse período, quando começam a falar, vejo logo que não sabem nada, não leram nada ou leram umas coisas na internet e já se acham uma grande autoridade. “Fomos esclavagistas”. E toda a parte científica, toda a parte das relações que nós vamos encontrar no mundo ainda, os vestígios da nossa passagem, a maneira como falam dos portugueses, como não se fala dos espanhóis. Eu tinha de dizer no México que era portuguesa, porque quando falava espanhol não me respondiam ou respondiam de forma bruta. Assim que dizia que era portuguesa o tom mudava completamente. A história da Tailândia, a história daqueles povos do Oriente, antes de os portugueses irem para lá era uma história oralizada, mítica. Os portugueses, como o Fernão Mendes Pinto, é que escreveram a história daqueles povos. Quando os muçulmanos começaram a espraiar-se por essas zonas, foram apagando toda a influência portuguesa e, depois, reescreveram a história, o que nos faz lembrar aquele documentário que a Al Jazeera cortou. É pôr os portugueses como vilões e apagar a sua própria vilania.
Mas não acha que nós, portugueses, também temos um certo tabu em relação à escravatura? Pois temos. E isso tem de ser assumido. Eu acho um disparate a discussão sobre o museu, chamem-lhe da Expansão ou das Descobertas. Houve mesmo expansão e descobrimento, no sentido que nós, no Ocidente, desconhecíamos toda aquela parte do mundo, que os portugueses descobriram para o Ocidente. É tão simples como isto. Tem de se assumir a escravatura, como era nesse tempo em que fazia parte do sistema, na maioria das nações do mundo. Os que não transportavam escravos compravam os escravos. Era o sistema económico no Ocidente e não só no Ocidente, era na África, entre os próprios africanos, era no Oriente, com os muçulmanos. Os muçulmanos começaram com a escravatura muito antes de nós. De repente é tudo virgem? Tem de se assumir a brutalidade comum a todas as nações nesse tempo. Eu assumo isso nos meus romances, vem sempre a parte violenta e a parte da canalhice, mas há também gente fabulosa. Afonso de Albuquerque era brutal para os muçulmanos, mas protegia os indianos, desde que respeitassem as regras. Ele proibiu em todos os lugares sob domínio dos portugueses que as indianas que fizessem o sati – o sacrifício das viúvas, que se lançavam na pira com os maridos. Promoveu os casamentos das mulheres locais – indianas, chinesas, javas, etc. – desde que fossem cristãs, com os portugueses. No entanto, houve gente que dizimou populações também.
Falta contar a história toda? 
Ui, há tanta coisa para contar e sem complexos. Porque, se não conhecermos o passado, o presente não vale muito e nós não teremos futuro. Isto é uma continuidade. Temos de olhar para trás para não fazermos as mesmas asneiras. Eu acho que os nossos políticos perdem muito por isso. Não conhecem a História do que ficou para trás.

16/11/2018

Apresentação dos Contos Eróticos do velho Testamento

Hoje, 6ª feira, dia 16 de Novembro, pelas 18.30 h, na Biblioteca do Palácio das Galveias, estaremos à vossa espera para a apresentação dos Contos e Novos Contos Eróticos do Velho Testamento, pela voz, graça e talento da Professora Maria Helena Trindade Lopes. Serão muito bem-vindos a esta divertida e ousada apresentação.

05/11/2018

CONVITE - TERTÚLIA COM DEANA BARROQUEIRO

Caros amigos e amigas, não querem vir tomar um café comigo e com o meu marido no dia do meu 45º aniversário de casamento? Pode ser divertido…

Dia 10.Nov - 19 h.
Restaurante Larg’O Tacho
Largo Agostinho da Silva, 1A - Lisboa
(ao Príncipe Real)

A Junta de Freguesia da Misericórdia, tem o prazer de o(s) convidar para a apresentação do livro “1640”, com a participação da autora, Deana Barroqueiro, integrado nos “Encontros com Autores” da Semana do Livremente.

01/11/2018

Apresentação dos Contos Eróticos do Velho Testamento

Caríssimos Amigos/Leitores

Como podem ver, pela ilustração, no dia 16 de Novembro, pelas 18.30 h, na Biblioteca Galveias (Campo Pequeno), a brilhante Prof. Dra. Helena Trindade Lopes, especialista em temas da Antiguidade Pré-clássica, vai apresentar a nova edição dos meus Contos e dos Novos Contos Eróticos do Velho Testamento, reunidos num único volume. Teria muitíssimo prazer em vos ver naquele simpático espaço, se estiverem por Lisboa Aos que estão longe fica a notícia e a sugestão para prenda de Natal, se quiserem oferecer um livro ao/à amado(a).
Um grande abraço
Deana Barroqueiro

Contos Eróticos do Velho Testamento - Entrevista a Deana Barroqueiro

Deana Barroqueiro: “Aquela gente do Velho Testamento era faminta de sexo” 

MARTA CERQUEIRA - OBSERVADOR - CARLA OLIVEIRA - Fotos

Casou virgem aos 27 anos, numa união que dura 45. 
Escreveu "Contos Eróticos do Velho Testamento" e vai processar João Botelho por plágio. 

Deana Barroqueiro tem 73 anos e foi desde que se reformou, aos 55, que se dedicou por inteiro à escrita - Carla Oliveira

A entrevista começou mais tarde do que o previsto porque tinha em mãos uma pilha de livros para assinar. “Sou incapaz de escrever apenas obrigado e está feito. A dedicatória tem que ser feita com tempo”, justifica. O atraso perdoa-se assim que se senta connosco e, sem filtro nem barreiras, fala de sexo, de homens, de mulheres, de uma Bíblia enfadonha, do seu casamento de 45 anos, dos jantares temáticos que prepara para os amigos, dos livros que ainda espera escrever e do plágio de que foi vítima e que, ainda que lhe tivesse tirado a concentração necessária à escrita, nunca lhe tolheu a capacidade de criar.
Assim é Deana Barroqueiro, uma mulher de 73 anos que viaja na história para explicar o presente. Assim o fez nos livros “Contos Eróticos do Velho Testamento” e no “Novos Contos Eróticos do Velho Testamento”, reeditados agora pela Editora Planeta num único volume a que voltou ao nome original “Contos Eróticos do Velho Testamento” e que diz ser de leitura obrigatória para quem quer perceber a raiz da discriminação sexual.

Serve este livro para explicar esta relação de inferioridade/superioridade entre homem e mulher? 
O que as mulheres têm sofrido ao longo de séculos vai buscar as suas raízes aos preconceitos, aos maus exemplos e à prepotência masculina que aparece no livro dito sagrado do Velho Testamento. São nessas histórias de exemplo, e que eu considero péssimos exemplos, habitadas por aqueles velhos patriarcas, libidinosos, hipócritas e cheios de vícios, que vemos as mulheres serem tratadas como se fossem objectos.

Indo à génese, conseguiu encontrar uma explicação para esta relação de superioridade masculina?
Eu não pretendia chegar a uma explicação, eu queria sim chegar de uma maneira quase física, quais as sensações das mulheres face a um mundo masculino que as aprisionou. Os homens escritores têm a mania que sabem muito sobre as sensações das mulheres, mas duvido que tenham o conhecimento tão profundo que qualquer uma de nós possa ter”.

E ainda aprisiona?
Aprisiona, claro. Basta olhar para o islamismo, ou o fundamentalismo judaico. Eu queria também mostrar a mulher, literariamente falando, do ponto de vista de uma mulher. Ou seja, não só através de personagens mulheres, mas também da escritora mulher. Foram poucas as mulheres com a ousadia de pegar nestes temas ditos sagrados.

Este livro podia ter sido escrito por um homem? 
Acho que não. Os homens escritores têm a mania que sabem muito sobre as sensações das mulheres, mas duvido que tenham o conhecimento tão profundo que qualquer uma de nós possa ter.

Fala no livro de mulheres “consideradas mercadorias e inferiores aos animais, conceito que perdura até hoje”. Será mesmo assim? 
Em muitos sítios, sim. As mulheres ainda são vendidas. A escravatura sexual, o tráfico humano, são tudo temas muito atuais. E se formos a outras tradições, como a indiana, ainda há crianças que são vendidas pelos próprios pais e forçadas a casar. Mas basta recuar ao tempo da minha mãe, em que a liberdade das mulheres era quase nula e se formos buscar os assédios sexuais, isso aí então, era o pão nosso de cada dia. Em Portugal, não existia o piropo, existia a obscenidade.

A Deana diz no livro que sofreu na pele o assédio sexual e a violência física e psicológica que é comum a muitas mulheres. 
Todas sofremos. Tivemos foi que aprender a dizer que não e a levar com as consequências, como perder os empregos.

Foi o seu caso? 
Ninguém me fechou numa casa de banho para me violar. Eu até casei virgem, embora só tenha casado aos 27 anos. Mas o assédio do dia a dia, nos transportes públicos, os apalpões, vivi isso tudo. Só não senti isso no trabalho, talvez por ser professora. Como a Maria Teresa Horta disse uma vez, a nossa geração inaugurou o subir na vida pelo nosso talento e não deitadas de costas numa cama.

O movimento #metoo é algo de inevitável? 
Chegámos ao momento de dizer basta. Foi bom esse movimento aparecer para que se fale abertamente do assunto, mas, como todos os movimentos, tenho sempre muito medo dos excessos. O que vejo acontecer é meterem no mesmo saco a violência sexual praticado sobre crianças que não tinham voz na altura e que anos mais tarde conseguem dominar o trauma e falar, outras que foram violadas sem se poderem defender e outras ainda, essas sim, que se aproveitam desses casos. Há muitas mulheres perversas, muitas mulheres que exercem um jugo sobre os homens.

Houve algum momento da história em que a mulher tenha sido figura dominante? 
As persas na antiguidade, antes de aparecerem os muçulmanos, eram mulheres livres e guerreiras. Na nossa história, era tudo uma questão de posses. Se uma mulher tinha posses, tinha poder. Mas no geral, foram sempre subjugadas. Aliás, sobretudo no século XVII, as mulheres vão para o convento para poderem ser livres, por estranho que isto pareça. Era a única forma de poderem estudar, para poderem ser músicas, médicas, cientistas, literatas.

O novo livro "Contos Eróticos do Velho Testamento" vai estar à venda a partir de dia 16 de novembro por €18,85

 E hoje em dia essa inferioridade feminina vê-se em quê?
Basta ver que foi preciso arranjar quotas para que as mulheres tenham lugar na sociedade. Eu defendo as quotas enquanto as coisas não se modificarem de vez, visto que o processo é longo. O que libertou a mulher em Portugal foi o ter que trabalhar, o ter que ajudar o marido. A história do homem ganhar o pão e a mulher ter que ficar com os filhos acaba com as dificuldades financeiras que obrigam a mulher a começar a trabalhar. Esse dinheiro trouxe-lhe uma liberdade, mesmo quando subjugadas ao poder masculino.

Essa inferioridade é só culpa dos homens? 
Não, as mulheres aceitam. Eu, por exemplo, quando casei, pensei para mim: ‘Vou dar-lhe três meses para que mostre as qualidades do dia a dia’. Se tentasse aprisionar-me não durava mais do que esses três meses.

E dura há quantos anos? 
Faço 45 anos de casada no dia 10 de Novembro.

Passou no teste.
Com distinção [risos].

Em Portugal temos muitas famílias matriarcais. Como é que se vive essa dualidade entre mulheres dominantes, mas subjugadas ao poder masculino? 
A minha família é um exemplo disso. Eu fui filha de emigrantes e a minha mãe era viúva de um vivo, uma vez que o meu pai viveu praticamente toda a vida nos Estados Unidos e foi ela que criou os três filhos, completamente independente do meu pai.

Essa superioridade masculina vê-se mais cá fora do que em casa? 
É um preconceito herdado deste livro sagrado que os padres promoveram por todo o lado. Uma vez quase que saí a meio da cerimónia de casamento de uma amiga quando ouço o padre dizer que ela tinha que obedecer ao marido, nem que ele lhe batesse. Quando ouvi isso, tive que me segurar para não sair porta fora ou dizer alguma coisa ao padre.

Isso já foi há muito tempo? 
Não há tanto tempo quanto isso. Aconteceu na minha geração. Só depois do 25 de Abril é que os horizontes se abriram, não sei como é que ainda há quem diga mal do 25 de Abril. Por amor de Deus, parece que não conheceram a ditadura.

Este livro, além de uma viagem histórica, é também uma viagem sexual. 
É uma viagem maravilhosa feita através das sensações. O pretexto para o erotismo foi-me dado pelo próprio Velho Testamento. Aquelas histórias estão imbuídas de sexo, aquela gente era faminta de sexo. O sexo está em todo o livro do Génesis com uma força incrível. Quando comecei a escrever o primeiro livro tinha 55 anos, tinha acabado de me reformar e pensei: ‘Isto é capaz de ser um bocado escandaloso’. Mas era um desafio. Estas histórias contam as sensações das mulheres através dos olhares dos homens, algo que sempre me irritou. De maneira que decidi dar uma perspetiva diferente.

É fácil escrever sobre sexo? 
Quando comecei a escrever o primeiro livro, escrevi cinco contos em 15 dias. Achei que tinha descoberto uma grande veia ou então era a raiva de ver a injustiça com que as mulheres eram tratadas naqueles textos. Entretanto rebentou o escândalo da Casa Pia e tudo aquilo enojou-me a tal ponto que deixei de escrever. Só quando a história acalmou é que escrevi os outros três contos e acabei o primeiro livro. E se este primeiro livro se focava na história dos homens, no segundo decidi dar voz às mulheres vencedoras, as mulheres que conseguiram dar a volta. Foi aí que surgiu “Os novos contos eróticos do Velho Testamento”.

Este novo livro é uma junção dos dois?
Mais do que uma junção dos dois, tentei fazer uma oposição dos dois. A primeira parte é sobre as mulheres sofridas, a segunda parte são as mulheres mais valentes, as sobreviventes.

Recorrer à história é uma forma de perceber melhor o presente?
Sim, nada como ler a Bíblia para ter essa noção. Aliás, considero a Bíblia um texto muito fraco, muito repetitivo, com exemplos muito inferiores a obras como a Odisseia ou a Ilíada. Basta ver os provérbios bíblicos, que são arrasadores, e de onde vêm os nossos próprios provérbios. ‘Quanto mais me bates mais eu gosto de ti’ ou ‘ Entre marido e mulher ninguém mete a colher’. Como é que é possível alguém dizer isto? Só pode ser um homem a dizer isto. Aliás, basta ver a história daquele juiz anormal que disse que as mulheres na Bíblia eram apedrejadas e que justificou uma agressão dizendo que a Bíblia pune o adultério com a morte. Pois pune, é isso mesmo que quero denunciar com estas histórias. Acho que vou sugerir à editora que envie os meus contos eróticos para o tribunal da Relação do Porto para eles lerem.

Saber mais sobre a condição feminina alterou a forma como olha para os homens?
Eu gosto muito dos homens, um mundos sem homens era uma seca. Sou totalmente defensora do casamento homossexual, ainda que seja heterossexual e não ache piada nenhuma às mulheres, fisicamente falando. Quer dizer, sei apreciar um corpo bonito, mas aprecio muito mais o corpo de um homem, mesmo que não seja tão bonito. O meu marido é feio, mas é um homem inteligentíssimo, qualidade que aprecio muito num homem.

Entre romances e poemas, Deana Barroqueiro tem já 14 obras editadas
Entre romances e poemas, Deana Barroqueiro tem já 14 obras editadas. Como é que faz a pesquisa histórica para os seus livros?
Viajo muito através dos rodapés dos textos, que me levam sempre a novos textos. Além disso, tenho uma grande biblioteca em casa e uma maior online. São gigas e gigas de documentos. Para este livro, por exemplo, cheguei a ler um livro do Egipto sobre medicina com mais de três mil anos. Sou uma espécie de rato de biblioteca, ainda que não vá a bibliotecas porque vejo muito mal, sou praticamente cega. É através do computador que consigo chegar a tudo o que preciso. Acho que se as pessoas lessem mais, falavam menos, principalmente de coisas que não conhecem.

João Botelho e o caso do plágio Em março, acusou João Botelho de plágio, depois de ter visto no filme “Peregrinação”, personagens que existem apenas no seu romance “O Corsário dos Sete Mares”. 
Passei os piores momentos da minha vida por causa dessa história. Estive sujeita a ameaças da ArtFilms, produtora do João Botelho, que diziam que me iam processar e pedir uma indemnização, à grosseria do Botelho, que escreveu uma crónica no jornal Público, na qual chamou aos jornalistas hienas porque me apoiaram. O problema é que ele esquece-se que me escreveu uma carta a admitir o plágio e a pedir desculpas.

Só descobriu que tinha sido plagiada quando foi ao cinema ver o filme?
Não. Eu fui contactada por dois leitores que me escreveram a dizer que tinham gostado mais do livro do que do filme e eu, de boca aberta, questionei: ‘Mas que filme?’. Era o “Peregrinação”, de João Botelho. ‘Até tem o seu nome no genérico’, disseram-me. E eu sem saber de nada. Começo a pesquisar na internet e leio as entrevistas do João Botelho em que fala das minhas personagens e episódios sem nunca referir o meu nome.

São personagens que só existem no seu livro? 
Sim. Até chamei o meu marido, para que visse comigo que aqueles nomes, aquelas personagens não existiam na “Peregrinação”. Aquilo era meu. Fui imediatamente ver o filme e nem lhe sei explicar a sensação que é começar a ver as cenas que eu tinha inventado passadas à tela. As lágrimas caíam-me e, ao mesmo tempo, sentia-me violada.

Se tivesse sido avisada, aceitaria participar no filme? 
Seria uma honra. Eu admirava o João Botelho. Mas assim, senti-me atropelada, porque, basicamente, o João Botelho não tinha filme se cortasse a parte que adaptou do meu romance. São 18 minutos de filme seguidos baseados na minha história. Se dizem que uma imagem vale mais que mil palavras, imagine a quantidade de imagens que estão naqueles 18 minutos.

O que fez? 
Cheguei à Leya, a editora do meu livro, e apresentei o caso. Eu não queria direitos de autor, não era isso que eu pedia.

O que queria então? 
Queria que me dessem os créditos. O meu nome aparecia no final de toda a ficha técnica, na parte dos agradecimentos, quando, na verdade, o meu livro serve de guião ao filme. Eu não lhe pedi para alterar o filme, porque isso não era possível. Pedi-lhe apenas que, nas entrevistas, dissesse que o meu livro era uma das fontes de inspiração. Nunca fez isso.

E o filme é agora o candidato português ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. 
Eu não deixo esta história morrer precisamente por causa disso. Em março, a Academia Portuguesa de Cinema nomeou o João Botelho para o prémio Sophia de melhor adaptação de uma obra literária, neste caso a “Peregrinação”, de Fernão Mendes Pinto. Mas a obra que ele adaptou é “O Corsário do Sete Mares” de Deana Barroqueiro. Escrevi para a Academia, decidi denunciar a história nas redes sociais e a comunicação social acabou por pegar no caso. É que de repente, eu passei a ghostwriter.

Vai a tribunal?
Finalmente a Leya decidiu pegar no caso e acabou de me dizer que sim.

Que conclusões tira desta história?
Conclusões muito tristes. Isto foi uma canalhice, não tem outro nome.

Nada nesse episódio a fez ter vontade de parar de escrever?
Não. Bem, no início sim, eu nem me conseguia concentrar. Mas eu sem escrever morro. E há uma coisa que ninguém me pode tirar, que é a capacidade de criar.

E essa capacidade vai levá-la, em 2019, a lançar para o mercado mais um livro histórico, desta vez sobre cozinha, que sei ser uma das suas muitas paixões. 
Costumo fazer uns jantares temáticas para os meus amigos, nos quais recrio pratos do século XVI ou XVII. Eu até cozinho bem e adoro organizar jantares, mas este não é será um livro de receita, será sim um livro de cozinha. Histórico, claro.

O novo livro "Contos Eróticos do Velho Testamento" vai estar à venda a partir de dia 16 de Novembro por €18,85