29/03/2010

Em Terras de Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva

Desejo expressar aqui os meus agradecimentos ao Exmo. Senhor Presidente da Câmara de Castelo Branco, Dr. Joaquim Morão Lopes Dias, pelo amável convite que me fez para uma apresentação do meu romance "O Espião de D. João II", na sua bonita cidade que muito amo. Um carinho extensível a toda a região que procurei homenagear com a minha obra, ou não fosse eu casada com um natural desta terra tão especial e que tantos heróis pôs no mundo.

No âmbito das festas do Município, a Exma Sra. Dra. Maria Cristina Vicente Pires Granada, Vereadora da Cultura, abriu o auditório da moderna Biblioteca Municipal, de que é directora, para receber, com extrema afabilidade e simpatia, os três escritores - Deana Barroqueiro, João L. Inês Vaz e Paulo Loução, que é simultaneamente o editor da Ésquilo - autores de três obras que tratam de personagens e temas da região, as quais foram apresentadas por ilustres personalidades albicastrenses: Pedro Salvado, Pires Nunes e Maria Adelaide Salvado. Podem ver aqui algumas fotos do evento.


Agradeço também a todos (e foram muitos) os que vieram assistir à apresentação, que pecou por demasiado extensa, por serem três obras e seis oradores, do que, pela parte que me toca, peço desculpa.

Quero agradecer ainda o convite do Exmo. Senhor António Carrega, Presidente da Junta de Freguesia da bonita vila de Alcains, pelo jantar de comida tradicional (gostosíssima) que ofereceu aos palestrantes, durante a festa da Feira do Queijo. um produto que pode rivalizar com o queijo da serra da Estrela.
A todos, a minha imensa gratidão!

26/03/2010

Heróis e Enigmas da Beira Interior

Amigos de Castelo Branco e arredores:

Não se esqueçam de que hoje, Sexta-feira 26, pelas 18.30 h. terá lugar, no Auditório da Biblioteca Municipal, uma apresentação de três obras que têm ligação com a Beira Baixa e não só:
- «O Espião de D. João II» de Deana Barroqueiro – pela Dra. Maria Adelaide Neto Salvado.
- «Os Lusitanos no Tempo de Viriato» de João L. Inês Vaz – pelo Dr. Pedro Salvado.
- «Grandes Enigmas da História de Portugal», Vol. I e II, coordenação de Miguel Sanches de Baêna e Paulo Alexandre Loução – pelo Dr. Pires Nunes. No Vol. II, o artigo «O Enigmático Espião de D. João II» é da autoria de Deana Barroqueiro.

Será um prazer voltar a ver-vos logo à tarde.

25/03/2010

Lembrete

Queridos amigos

Não querem aparecer, pelas 19 h., na Livraria Barata (Av. de Roma, 11 A - Lisboa), para conversar e dar apoio ao jovem autor, Pedro Medina Ribeiro, na apresentação da sua primeira obra?
Fico à vossa espera.

24/03/2010

"O Navegador da Passagem"... à vista!

Finalmente! Apareceu de novo e em força, nas principais livrarias e grandes superfícies, "O Navegador da Passagem", com a chancela da Porto Editora, que foi lançado em Outubro de 2008, esgotou em 15 didas e teve a 2ª edição disponível já em Novembro desse mesmo ano.
No entanto, o livro deixou de se ver a partir de Março de 2009 e, no passado Natal, quase não se achou à venda, pelo que os meus leitores se queixavam de só o conseguirem comprar pela internet.
Era frustrante, para mim, pois esta obra forma uma "dupla" com "O Espião de D. João II" (este publicado pela Editora Ésquilo), como se fossem as duas faces de uma medalha com a efígie do Príncipe Perfeito. A propósito das viagens do Navegtador Bartolomeu Dias, narra-se o reinado de D. João II, o seu projecto político e a luta contra as forças que se lhe opunham. Com o Espião Pêro da Covilhã e a sua Demanda das especiarias e do Reino do Preste João, fala-se do sonho desse grande rei, completando a história do seu reinado.

Fico muito grata à Porto Editora, por ter apostado novamente n' "O Navegador da Passagem", satisfazendo assim a procura dos meus leitores. Bem hajam!

19/03/2010

Agenda de Março

25 de Março, Quinta-feira, às 19 h.
Editora da Oficina do Livro-Leya, Livraria Barata


Lançamento do livro "A Noite e o Sobressalto"
de Pedro Medina Ribeiro.
Um jovem autor de grande talento, com histórias
de arrepiar.
Apresentação a cargo de Deana Barroqueiro

Espero-vos na Barata (Av. de Roma - Lisboa)
para uma amena cavaqueira


26 de Março, Sexta-feira, às 18.30 h.
Castelo Branco - Auditório da Biblioteca Municipal




A Biblioteca Municipal de Castelo Branco e a Ésquilo, Edições e Multimédia têm o prazer de convidar V. Exas. a assistir à sessão «Heróis e Enigmas da Beira Interior».
O evento será presidido pela Dra. Cristina Granada, Vereadora do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Castelo Branco.
Farão alocuções sobre o tema, a Dra. Deana Barroqueiro, o Prof. Doutor João L. Inês Vaz, o Prof. Paulo Alexandre Loução.
Serão apresentados três livros relacionados com o tema:
- «O Espião de D. João II» de Deana Barroqueiro – pela Dra. Maria Adelaide Neto Salvado.
- «Os Lusitanos no Tempo de Viriato» de João L. Inês Vaz – pelo Dr. Pedro Salvado.
- «Grandes Enigmas da História de Portugal», Vol. I e II, coordenação de Miguel Sanches de Baêna e Paulo Alexandre Loução – pelo Dr. Pires Nunes.

Obs: Nesta obra, o artigo «O Enigmático Espião de D. João II» é da autoria de Deana Barroqueiro.

Contamos com a sua presença!

18/03/2010

Desde o Minho...

A Voz do Silêncio

Descemos as escadas de pedra, devagar, até à planície de retalhos verdes, amarelos e vermelhos. Açucena empurrava o vento com os braços esticados, e dizia que as ervas eram o tapete do rio, os malmequeres a jarra da avó e as papoilas um dos sonhos da Bela Adormecida. E eu perguntava-lhe por outros sonhos e ela fechava os olhos e não me respondia.

Começou a pingar. Recolhemo-nos debaixo de um alpendre. Nas traves de madeira carcomida, ouviam-se as alcoviteirices dos pássaros e ela continuava com os braços esticados para apanhar a água do céu. Depois, em cima dum carrinho de mão estacionado numa meda de palha, passava os dedos na cara, e com as avelãs dos olhos à mostra dizia que a Bela Adormecida já tinha acordado.

Isabel

17/03/2010

Oferta do blogue Sorumbático


EM AGRADECIMENTO pela participação dos nossos leitores, Carlos Medina Ribeiro, que publicou no blogue Sorumbático o texto "Um Professor suicidou-se" oferece um livro aos autores dos três comentários que melhor abordaram o problema em discussão:
Fernando Rebelo, Gonçalo Correia e Fernando.
Os três têm, a partir de agora, 24h para escreverem para premiosdepassatempos@iol.pt indicando, por ordem decrescente de preferência, o que preferem: Capitães da Areia, Entre o Pavor e a Esperança, ou um livro da lista que pode ser consultada [Aqui]; e morada para envio, evidentemente.

Muito obrigada, amigos.

14/03/2010

A propósito do assédio ("bullying")

Agradeço profundamente aos que se deram ao trabalho de me ler e de deixar os seus comentários ao meu texto, tanto aqui como no blogue "Sorumbático". Foi para proporcionar essa troca de ideias com os meus leitores ou outros cibernautas que eu quis ter, além da minha página de escritora, este blogue.

Não pretendo ser "modeladora de opiniões" (já os há em demasia e não tenho formação para tão difícil empresa). Escrevo apenas sobre o que conheço ou o que observo, em particular, sobre o que me alegra ou me desgosta além do razoável e não suporto ver gente humilhada ou subjugada a qualquer tipo de poder.

Reajo instintivamente, à ameaça ou intimidação e contra-ataco, mesmo sabendo o perigo que corro. Não se trata de bravura, mas desse "Síndrome de Joana d'Arc" que me impele a lutar contra a injustiça. Desde menina.

Por isso, também tinha dificuldade em aceitar que um professor - sobretudo um homem, porque a matilha dos opressores escolhe habitualmente professoras muito jovens ou idosas, por serem presa fácil -, não conseguisse controlar uma turma e se deixasse abater, ao ponto de cair em tal depressão que necessitasse de tratamento psiquiátrico ou o pudesse levar ao desespero do suicídio, como confessou o colega na sua nota de despedida.

Contudo, ao longo dos últimos anos, fui vendo aumentar a indisciplina e diminuir a capacidade das escolas e os seus instrumentos para a conter, por obra e graça das directivas e reformas do M.E. O sentimento de impunidade e do "vale-tudo" tornou-se regra entre os estudantes e ai daqueles que se tornem seus alvos e não reajam ou não consigam impor-se-lhes. Há os que o conseguem, com mais ou menos luta; outros, para sobreviverem, "fazem o jogo" dos alunos, deixando-os "à solta"; os mais fracos e sensíveis são triturados.
Assisti, apesar da ajuda que colegas e membros do Conselho Directivo lhes prestasvam, à destruição de alguns colegas (homens e mulheres) que tinham vindo para o ensino cheios de esperança e de desejo de se fazerem bons profissionais. Não lhes deram essa oportunidade.

Cada vez há mais casos de professores com problemas de depressão, há artigos, relatórios e estatísticas sobre isso, mas também sei que só quem tenha um contacto próximo com a comunidade escolar conseguirá perceber a gravidade do problema. Daí que a situação se tenha vindo a agravar a passos de gigante. Sem a solidariedade e a compreensão dos seus pares e da sociedade, o indivíduo fica isolado, vulnerável e indefeso.

Em que outra profissão, um trabalhador (e a classe dos professores é aquela cujos membros têm mais habilitações académicas e profissionais, actualmente já todos têm Licenciaturas e muitos o Mestrado) está sujeito a sofrer, diariamente e durante seis ou oito horas seguidas, o desgate de vagas sucessivas, de 25/30 crianças e adolescentes "apenas" barulhentos e desatentos, embora simpáticos (no melhor cenário) ou indiciplinados, violentos e grosseiros (nos piores casos)?

Por que razão não tem o professor o direito, como qualquer outro profissional em contacto com o público, de se recusar a dar aulas a uma turma de alunos que o ofendem e humilham, que se estão nas tintas para o que ele lhes quer ensinar e lhe fazem a vida negra?
Não pode, porque, se se recusar, fica sujeito a um processo disciplinar, com consequências gravíssimas. Só poderá libertar-se abandonando o ensino, se tiver outros meios de subsistência ou se estiver disposto aos riscos de mudar de vida, a meio da carreira, para começar de novo, depois de ter passado os seus melhores anos como professor.

Muitas vezes os colegas e a direcção da escola não sabem do seu sofrimento porque os visados não contam o que se passa, por vergonha (vejam a entrevista no link do post anterior, embora não seja sobre a escola, refere inúmeros casos patéticos de suicídio devido ao assédio), o que os leva a isolar-se cada vez mais. Tal como acontece com os alunos vítimas de assédio (prefiro a palavra portuguesa ao "bullying") dos colegas mais velhos ou mais fortes, quase sempre em bando.

Há uns anos, eu aconselhava a minha profissão aos mais jovens, agora digo a todos para a evitarem, tal como aconselhava a frequentar a escola pública e, agora, aconselho a privada, não por terem melhores professores, mas porque aí os pais pagam balúrdios de propinas e obrigam os filhos a comportarem-se bem e a estudarem, para que eles não sejam recusados ou expulsos por essas escolas. As públicas são praticamente gratuitas e, mesmo com cadastro, um aluno não pode ser recusado e é quase impossível expulsá-lo.

Tive, durante cerca de 30 anos, a paixão do ensino, nos últimos anos perdi-a quase por completo. Aposentei-me por antecipação e com penalizações. Retomei a escrita, senti-me renascer e voltei a ser feliz. Mesmo assim ainda fui a muitas escolas falar aos alunos, porque sentia-lhes a falta. Tenho uma grande capacidade de comunicação e sempre captei a atenção dos jovens com as minhas histórias.

Agora, já nem isso se consegue. Não voltarei a perder o meu tempo e as energias a ir às escolas falar para uma massa barulhente e grosseira (a última sessão foi numa das boas escolas de Lisboa, só com Secundário e num bairro tradicionalmente rico), que só ali está para "se baldar às aulas" e, apesar da vigilância dos professores, faz tudo para estragar a conversa que alguns alunos ainda interessados procuram manter.

Quando se passar a responsabilizar os pais pelo abandono e mau comportamento dos filhos, talvez as coisas mudem.

Um suicídio no trabalho é uma mensagem brutal

Entrevista a Christophe de Dejours no Público, sobre um tema e uma realidade de que ainda se fala muito pouco. É extensa, mas vale a pena ler. Conclusões esmagadoras, as deste psiquiatra e psicólogo, director do Laboratório de Psicologia do Trabalho e da Acção (Paris). Explica bem o acto do professor de Sintra.
Leia a entrevista Aqui

13/03/2010

Um Professor suicidou-se

Suicidou-se um professor.

A anterior equipa do Ministério da Educação, se ainda estivesse em funções, diria certamente que ele era um dos muitos professores sem perfil para a complexa missão de ensinar crianças ou adolescentes, dos docentes que nunca poderiam progredir na carreira, dos que deveriam ser avaliados por quem de direito o poderia fazer com rigor, por serem os mais directamente interessados – os seus alunos e os respectivos Pais ou Encarregados de Educação.

Com a boa prática de estes últimos começarem a interessar-se muito mais pelo trabalho dos filhos, indo com maior frequência à escola, sobretudo para pedir satisfações ou até administrar uns tabefes ao docente que não souber levar o seu educando, mesmo contra vontade da criança ou do adolescente, a frequentar as suas aulas e, coisa mais rara e improvável, a estudar.

Suicidou-se um professor.

E, se ainda estivessem em funções trabalhando para impor a sua brilhante reforma do ensino, a anterior equipa ministerial diria talvez que o professor suicida era a prova viva de que tinham razão quando se devotaram, desde o primeiro dia da sua tomada de posse, à necessária e espinhosa tarefa de disciplinar a classe, “metendo os professores na ordem”, de os “triturar”, se necessário fosse, por serem uma classe de incompetentes, preguiçosos e absentistas.

Suicidou-se um professor.

Com esta desvalorização da classe, os professores foram espoliados da sua dignidade, despidos de toda a autoridade, deixados indefesos e sem recursos, no exercício de uma profissão que é das mais difíceis, exactamente pelo que exige dos seus membros e da relação com o Outro (os alunos), tão infinitamente delicada que o mais leve sopro a pode romper.
Face a uma sociedade cada vez mais grosseira, inculta, desprovida de ética e de moral – cujos maus exemplos vêm de cima, a começar por aqueles que nos desgovernam para se governarem –, em que muitos pais, para não dizer a maioria, se demitiram da sua função de pais e guias da vida dos seus filhos, não lhes inculcando no tempo devido (desde o berço) os mais básicos princípios de disciplina, civismo e decência.

Os alunos deixaram de respeitar os professores e de ouvir os seus ensinamentos, insultando-os e humilhando os mais fracos, porque a tutela os desrespeitou e humilhou.
Em muitas escolas as aulas transformaram-se em arenas e muitos professores não conseguiram enfrentar o pesadelo e desistiram ou adoeceram. Porque não têm apoio, porque a escola não quer ou não pode agir.

E um professor suicidou-se

Quando a antiga equipa ministerial viu os vídeos que passaram nas televisões, com crianças e adolescentes a portarem-se nas aulas como no recreio ou num circo, a insultarem e baterem nos colegas e em professoras (jovens e idosas, para as crianças isso não conta, quanto mais frágil for a vítima, tanto melhor…), negaram a evidência e tomaram por excepção o que começava a ser uma regra.

Seis mil professores pediram, no mesmo ano, a aposentação antecipada.
E, agora, um professor suicidou-se.

Se a anterior equipa ministerial estivesse em funções talvez fizesse um inquérito aos alunos do professor suicida, para apurar se estes jovens do 9º ano, com uma idade média de 15 anos, que o empurravam, lhe davam “calduços” e chamavam “cão”, não teriam ficado traumatizados pelo acto tresloucado do seu suicídio. Não hesitariam seguramente em fazer-lhe um processo disciplinar a título póstumo.

Um Professor suicidou-se.
Antes de se lançar ao rio, escreveu no seu diário: “Se o meu destino é sofrer, dando aulas a alunos que não me respeitam e me põem fora de mim, não tendo outras fontes de rendimento, a única solução apaziguadora será o suicídio”.

A anterior equipa ministerial não é a única culpada da degradação do ensino, ela é fruto da degradação da nossa sociedade e toda a comunidade tem culpa, por se demitir das suas funções e dos seus deveres.

Talvez o desespero e a morte deste Professor façam despertar as consciências e haja uma reflexão séria sobre o estado a que chegou o nosso ensino, a nossa política e a nossa sociedade.

Eu escrevo com dor e asco. Para que os Professores que sofrem ou conhecem estas situações as denunciem e que se repensem as leis e os estatutos dos Professores e dos alunos, de modo a que os docentes possam ensinar num bom ambiente de trabalho, os alunos prevaricadores possam ser punidos com severidade e os pais responsabilizados pelo mau comportamento dos seus filhos.

10/03/2010

Desde o Minho...

O meu sorriso

Era uma tarde como outra qualquer. Eu acomodei o corpo ao assento do carro. Ele tardaria um pouco mais a chegar. Gosto de me antecipar à hora marcada, para apreciar o antes. Esfregava as mãos e impingia-lhes o sopro de uma boca sem palavras. Lá fora, os carrapichos verdes das árvores ao fundo, agitavam-se, comovedores como asas fincadas. Pelo pára-brisas desceu um gato pardo, como se adivinhasse que no assento
de trás havia um peixe avermelhado num frasco de vidro, que arregalava os olhos e batia com a cauda em desespero.

Depois dos estendais, era um campo descosido de vedações, onde o Maio costuma soltar flores de muitas cores, encavalitadas na sombra que os pássaros deixam ficar.

Decidi abrir a porta. O gato escapuliu por um vau que eu desconhecia. Corri pelo campo fora, com asas cosidas aos braços e numa nuvem cinzenta verti a água do frasco e o peixe foi com ela. Viajaram até à beira do rio e quando ele chegou junto a mim mostrei-lhe as minhas mãos molhadas, com cheiro a cardume.
Beijou-me os olhos e eu acordei.


Cerzir palavras

A névoa aos pés do rio era manto alinhavado por escamas. Assim o descreveu a minha boca fechada no papel desdobrado em cima da pedra, numa friagem que intumescia as palavras de uma cor misteriosa. Um pintarroxo poisou num barquito que vacilava entre a noite e a madrugada. Tinha uma baga presa no bico.

Só quando raiava e a aura lhe trazia o pescador de volta, a rota das pétalas era retomada. Ele vinha com o pendor da lua nos lábios. O mesmo rosto escanhoado e as mãos grandes na flor prensada em páginas manuscritas, lá no fundo do cesto de vime, com cheiro a horas coadas por redes quiméricas. Eu via-os partir. E durante algum tempo vogava com eles. As asas soltavam as amarras do pensamento. O sacudir das águas calçava os pés do rio lentamente, como quem quer seguir o sonho que medrou e que o simples piar delata.

Uma chuva morna ancorou pouco depois e descreveu ilhas azuis no papel e istmos nos meus dedos. A écharpe escorregou. Caiu no chão. Voltou ao contorno do pescoço. Notei-lhe tufos. Eram as pétalas garridas que o pescador não soube achar.


Navegadora,
Uma tarde de Inverno à lareira e com a Maria João Pires a tecer o ar de brilhos.
O beijinho e o sorriso.

Se o azul do céu tiver corrupios brancos são sementeiras de palavras.

Isabel

09/03/2010

Das Mulheres no Velho Testamento

No rescaldo do Dia da Mulher, lembrei-me de uma das numerosas "histórias exemplares" do Velho Testamento que serviram de base aos meus contos, que tenho estado a refazer para uma nova edição. É muito significativo da condição da mulher, ainda nos nossos dias (como a violência doméstica e o número de mulheres mortas pelos companheiros), ver como nesta parábola é aceite como coisa natural o crime hediondo contra uma mulher indefesa e inocente, que o próprio marido entrega aos algozes para salvar a pele. Passa-se em Gabaa, com a mulher de um levita, hospedado na casa de Ard.

"Enquanto restauravam as suas forças, comendo e bebendo, vieram os habitantes da cidade, gente péssima, e, cercando a casa do velho, bateram violentamente à porta, dizendo:
- Traze cá para fora o homem que entrou na tua casa, pois queremos abusar dele.
Ard saiu e foi ter com eles, dizendo:
- Não queirais, irmãos, cometer semelhante maldade, pois este homem é hóspede da minha casa. Não pratiqueis semelhante infâmia. Aqui está a minha filha virgem e a mulher deste homem. Eu vo-las trarei, e vós podereis fazer delas o que quiserdes; somente vos peço que não cometais contra este homem esse crime contra a natureza.

Eles, porém, não o quiseram ouvir. Então o levita, vendo isto, trouxe-lhes a sua mulher: eles conheceram-na e abusaram dela durante toda a noite e despediram-na ao amanhecer. Ao romper do dia, veio a mulher à porta da casa onde estava o seu marido e caiu morta.

Chegada a manhã, levantou-se o marido e, ao abrir a porta para continuar o seu caminho, eis que a sua mulher jazia diante da porta, com as mãos estendidas sobre a soleira. Julgando-a adormecida, disse-lhe:
- Levanta-te e vamos.
Mas a mulher não lhe respondeu. Tomou-a, então, pô-la sobre o jumento e regressou à sua casa.

Chegando à sua casa, tomou o cutelo, dividiu o cadáver da sua mulher, membro por membro, em doze partes, e enviou-as a todas as tribos de Israel."

(in "Bíblia Sagrada" - Nova edição papal, traduzida das línguas originais, com uso crítico de todas as fontes Antigas, pelos Missionários Capuchinhos).

Ora, nem nesta Bíblia, comentada numa auto-declarada visão crítica, surge a mais leve censura ao crime feito à mulher ou aos dois homens que a sacrificaram, nem sequer pela profanação do cadáver, esquartejado e enviado às tribos de Israel para pedir vingança, não pela morte da mulher mas apenas pela ofensa feita ao marido.

O coração dos Missionários Capuchinhos nem sequer se comoveu com a imagem da mulher caída no chão, com as mãos estendidas para a soleira da porta numa súplica vã, no seu comentário só é referida a "baixeza moral" dos benjamitas, pelo pecado da sodomia.
Este episódio é uma repetição da história de Lot, com idêntica "moralidade", esta com a agravante de justificar o incesto de Lot com as duas filhas.

Como já referi, neste blogue, pretendo com os meus contos, denunciar essa tradição da condição da mulher, desprezada, aviltada, usada pelos homens como objecto de compra e venda, inferior ao gado dos seus rebanhos, e como animal de procriação, veiculada nos ditos livros sagrados das três religiões principais e de que, mesmo no Século XXI, a mulher ainda continua a ser vítima, em nome de Deus, com afrontoso despudor e impunidade, sobretudo nos países muçulmanos.

05/03/2010

Saiu a 2ª Edição d' O Espião de D. João II

Finalmente, meus queridos leitores, deu-se o parto da 2ª edição d'O Espião de D. João II, revista e com um Prefácio do Dr. Guilherme d'Oliveira Martins. O romance viu a luz esta semana e julgo que já terá deixado a incubadora, para se mostrar em público no berçário das livrarias.

Lembro-vos (e soube-o por muitos de vós, leitores amigos) que a 1ª edição esgotou antes do Natal. Nessa semana, como vos disse em outra postagem, no dia 21 de Dezembro já não havia um único exemplar em todas as livrarias e espaços de venda de livros, do Centro Comercial Colombo. E o mesmo sucedia na Baixa e em outros sítios de Lisboa. Leitores de Aveiro e Castelo Branco disseram-me que quiseram oferecer o romance e não o acharam em parte alguma, livrarias ou grandes superfícies.
Foi frustrante!

Os que andaram à procura e lhe sentiram a falta, se ainda for a tempo, ficarão satisfeitos com a versão corrigida e prefaciada com um belo texto do Dr. Oliveira Martins.

Agradeço também aos que me têm visitado aqui, neste blogue e na minha Página, e peço desculpa pela ausência, mas fui atacada fortissimamente por uma ideia para o meu segundo livro que me tem empolgado e, portanto, escravizado. Quando isto acontece, não há nada, ou quase nada, que logre desviar-me da escrita e eu estou desde Janeiro sem sair de casa (só para as consultas do hospital - ainda tenho cicatrizes no remendo do nariz, mas vai bem), feita bicho-do-mato, intratável, mas muito sensibilizada quando me escrevem.

Estou também a rever os dois volumes dos Contos e Novos Contos Eróticos do Velho Testamento, que dificilmente se encontram no mercado, tendo em vista uma nova edição num só volume. Considero estes contos os meus melhores textos, por neles ter ousado mais do que em qualquer outra das minhas obras e por estarem escritos numa linguagem poética, que é a mais íntima de mim.

Há quem diga que não vale a pena escrever contos, por não haver leitores para eles. Custa-me a crer! Podem ser belíssimos desafios da arte de escrever. Que pensam os meus queridos leitores? Podem dar-me a vossa opinião, para eu decidir se vale ou não a pena fazer nova edição?
Bem hajam!

Um beijo de muita amizade
Deana