04/09/2010
O Puzzle do Leitor
Neste momento, estou com dois livros "em construção", um com cerca de 100 páginas, que comecei depois de ter terminado "O Romance da Bíblia", e outro, que já convive comigo há alguns anos e tem 250 páginas. É um velho hábito meu ter duas obras em conversa ou em confronto uma com a outra, para não bloquear ou enjoar o tema. Não vou revelar o nome dos respectivos heróis (portugueses, claro, embora de duas épocas diferentes!), porque, tal como disse a um dos meus leitores no Facebook, as obras podem ficar pelo caminho, pois nem sempre conseguimos fazer o que desejamos. No meu caso, é a escrita que me comanda e não o contrário.
Escolhi dedicar-me ao romance que se "impôs" posteriormente (apesar de estar mais atrasado do que o outro) e terminá-lo primeiro, por tratar da expansão portuguesa no Extremo Oriente, a parte dos Descobrimentos que ainda me falta narrar, para que os meus leitores possam ficar com uma perspectiva global, assaz aprofundada da saga das Descobertas e do seu contexto temporal e espacial.
Espero concluí-lo em 2011 e posso garantir-vos, desde já, que herói é tão fascinante quão empolgantes são os sucessos que presenciou ou de que foi protagonista!
Disse-vos, num dos textos desta Conversa (gostaria muito que me deixassem aqui mais comentários, para o convívio não se reduzir a um mero monólogo e podermos estabelecer um verdadeiro diálogo), que construía os meus romances como um puzzle, mas deveria ter dito melhor: como peças de um puzzle que o leitor das minhas obras irá construindo a partir da sua própria leitura. Encaixando as peças segundo o seu conhecimento do tema, ora detectando as pistas que o narrador lhes dá e as suas
"piscadelas de olho" cúmplices que remetem para uma abundante intertextualidade (não só de obras escritas, mas também de intertextos culturais, sociais, geográficos e todos os que contribuem em qualquer época para a vida dos povos), ora seguindo o percurso de algumas personagens que se passeiam por mais de um romance, tal como era possível encontrá-las em companhia umas das outras, nas naus ou nas caravanas das viagens por terra e por mar.
Enquanto autora, é esse o meu desafio ao leitor. E, para meu imenso prazer, tenho recebido retorno, com generosidade!
Quanto ao segundo livro, que está mais adiantado mas tão cedo não será terminado, vai na continuidade do D. Sebastião e o Vidente, já no Século XVII. Nele se atam algumas pontas que ficaram soltas naquele romance, devido à obrigatória economia narrativa num livro com mais de 600 páginas.
É uma obra de difícil construção e um desafio maior ao leitor, por isso me há-de levar ainda muito tempo de investigação detectivesca e de escrita feita com prazer, suor e lágrimas.
4 comentários:
Essa ideia de ter duas obras em "execução" ao mesmo tempo não fonciona comigo... tenho neste momento quatro começadas(duas em parceria com amigose mais meia duzia de ideias para outros livros) e ando sempre a saltar de um para o outro sem conseguir realmente avançar em nenhum... e o que é pior parece que eles ganham vida própria e livros que deviam abordar um tema ou época estendem-se até perder o fio à meada...
Já agora acabei de ler agora o "D. Sebastião e o Vidente" e adorei...
Parabens (apesar do grande atraso) por mais um excelente livro.
Viva!!! Que bom ter notícias suas!
Confesso que ultimamente não vos tenho visitado muito, por andar em bolandas, fora de casa e também metida nas escrevinhações. As minhas desculpas!
Percebo o que quer dizer, com os livros ganharem vida própria e o problema da sua extensão. Temos de cortar sem piedade, o que é bastante difícil. Eu já consigo fazer isso sem muita dor. Corto sempre mais de 100 páginas a cada livro e mesmo assim eles ficam demasiado grandes.
Tente não se dispersar por tantas obras. 4 são muitas! Registe as ideias mas procure seguir aquela obra que está a gritar por si com mais desespero, ansiosa por ver a luz e dar conta do seu destino.
Eu estou morta por voltar ao meu livro do Séc. XVII, mas agora disciplinei-me e fiquei só com o do Séc. XVI, porque quero acabá-lo no próximo ano. Tem de fazer essa escolha ou nunca mais acaba nenhum.
E agora até há editoras à procura de novos autores...
Muito obrigada por ter gostado do meu D. Sebastião!
Um grande abraço e força para a sua escrita.
Passei por aqui para agradecer a publicidade que tem feito (aqui e no facebook) ao nosso blog e deparei-me com o comentário do Mário e a sua resposta.
Se não estou em erro era o Saint-Exupery que escrevia calhamaços de mais de 700 páginas e depois cortava a eito até ficar reduzido àqueles romances pequeninos que ele publicava.
Mas quando os livros, como disse o Mr.Nonsense ganham vida é extremamente complicado de o fazer.
Uma das parcerias de que ele falava é um romance que começamos a escrever depois de me ter "roubado" a história do Pero da Covilhã e se a ideia era escrever uma coisa simples passada num determinado momento (não especifico para não nos "roubar" também esta história) a verdade é que a história fugiu do nosso controle e a acção já vai a decorrer num periodo de quase cem anos... e não sabemos como a havemos de acabar... nem por onde começar a cortar.
Viva, querido Diogo.
Se me permitem a sugestão, acabem primeiro a obra e cortem depois o excesso. Mas têm de dar um fim ao romance num momento em que a narrativa principal vos dê o pretexto para uma possível conclusão (pode haver inúmeras).
Devem evitar o excesso de focos narrativos, de micro-narrativas que dispersam a intriga principal e muitas vezes fazem com que o leitor se perca.
Esse é o problema que mais me preocupa, pois também me apetece contar TUDO! E não pode ser, pelo perigo de transformar um bom romance num tijolo que só serve para partir cabeças, no sentido físico e literário da expressão.
Por isso corto que me farto, sem piedade por mim, cuja alma chora, nem pelas vidas das personagens truncadas que me suplicam, com lágrimas de sangue, que as poupe.
Custa muito à primeira obra, vai-se atenuando o sofrimento pela repetição do crime.
Terminem a vossa obra e, então, comecem a aperfeiçoá-la e a melhorá-la - que é quando se vê quanto se pode cortar sem mutilar a história principal, que quase sempre fica melhor com a concentração da intriga.
Espero não estar a meter o bedelho onde não sou chamada, Diogo, mas pelo que escreveu aqui, deu-me a impressão de querer que eu lhe dissesse a minha opinião. Pelo que arrisquei a falar-lhe da minha experiência, quer como autora, quer ainda como orientadora de algumas acções de escrita criativa que fiz aos meus alunos.
Um beijo
Deana
Enviar um comentário