Para o Terreiro do Trigo
Pela Rua da Misericórdia da Porta do Terreiro iremos dar à Ribeira Velha e passamos agora pela Igreja e Casa da Misericórdia, construída ao mesmo tempo que o Mosteiro dos Jerónimos (onde hás-de viver mui feliz de ora em diante, asninha preciosa!), nos terrenos que El-Rei D. Manuel deu por troca aos Cavaleiros da Ordem de Cristo. Nesta obra laboraram arquitectos e escultores estrangeiros mui famosos. Tem um portal mui bem lavrado na sua fachada, a sul, com a Senhora da Misericórdia a estender o manto da Justiça por sobre ricos e pobres.
Da porta travessa tem aquela larga escaleira que desce até à praia. Por trás da Igreja, há dois recolhimentos d’órfãos, um hospital e casas de serviço para socorro d’enjeitados, presos e enfermos pobres, enterro de mortos desamparados e dotes para casar orphãs, tudo sustentado por esmolas de pessoas generosas e dádivas da Casa Real. Às quartas-feiras, sextas e Domingos, os irmãos fazem mesa e dão comida aos presos e necessitados. As procissões da Casa da Misericórdia são as mais belas e solenes de Lisboa.
Finalmente o Largo do Terreiro do Trigo! Encostado ao vestíbulo da Igreja da Misericórdia, no lado do nascente, está o Celeiro de Portugal que dá o nome ao Terreiro do Trigo, mandado fazer por El-Rei D. Manuel para agasalhar todo o pão de que há mister a cidade e mais o termo, dar franquia a quem o traz de fora do Rei no e aliviar o povo quando há fome. É mui famosa edifício, composto por dous lanços de casas que tem 24 braças de comprido e 62palmos de largo, com 32 arcos de pedraria por banda e entre cada arco tem uma loja que leva 50 moios de trigo.
As 48 lojas formam duas ruas abobadadas e ladrilhadas, tendo ao centro um pátio liso e estreito. Nele se encosta o assento da Alfândega Nova (onde se arrecadam os direitos das mercadorias), estendendo-se até à beirinha do mar, todo feito em pedra escorada com grandes estacas espetadas a maço no mar, fazendo espanto a quem o vê.
Já te vês perdida, formosa Esmeralda? não tardarás em saber o caminho, que to hei-de mostrar outras muitas vezes, que aqui vimos sempre nos dias de fazer a mercar todo o fato de que hão mister os nossos fradinhos Jerónimos. Não te quero enfadar, minha frol, com esta aravia, porém levo já tanto ano a sós comigo que já nem sei falar a uma asninha assi moça e çucarenta como tu… Gostas?! Que te conte mais?! Hufá!!!
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