07/02/2014

No jardim do bem e do mal

Apesar de se referir a Macau, este adivinho chinês do templo de Nwua parece estar a falar de Portugal.
O Governo vai galopar em confusão e lutas internas com o Cavalo. Há cinco flores a desabrochar.
Sónia Nunes
Há vezes em que no mais recatado dos lugares ouvimos as mais agitadoras revelações. Esta é uma dessas vezes. O futuro chegou como se fosse um tiro, rápido, directo e com consequências ainda por estimar. “‘Wah! Ma fan’”, diz o adivinho em cantonense, quando deita o primeiro olhar ao ‘tsim man’, o papel que decifra o destino que nos calhou. Fizemos uma pergunta: que sorte reserva o Ano do Cavalo para o Executivo e os cinco secretários? ‘Ma fan’, repete o adivinho, que antecipa meses de grande confusão, diferenças irreconciliáveis e muita competição ou não fosse também este o ano em que será formado um novo Governo.
Quem fica? Quem sai? Chan Kam Cheok, o adivinho que toma conta do templo de Nuwa, no arranque da Rua das Estalagens para quem vem da Rua de São Paulo, não quer responder. Pelo menos, não de forma directa. Fala através de alegorias. “Há cinco flores que desabrocham ao mesmo tempo”, diz. E lá confirma que podemos estar a falar das cinco secretarias do Governo. A imagem remete, no entanto, mais para um ambiente de concorrência do que para uma bem-aventurada Primavera. “Quando as flores nascem todas ao mesmo tempo é difícil ver o que é cada uma. Temos apenas uma ideia geral, do todo”, explica.
Chan Kam Cheok está a interpretar o papel trazido pelo pauzinho da sorte, o primeiro a cair do cilindro de madeira, que agitamos de joelhos em frente à deusa Nuwa, que criou a humanidade e mantém a parede que separa o Céu da Terra. Antes de se avançar com as perguntas é preciso primeiro render três vénias com três pauzinhos de incenso na mão aos deuses e saber se estão disponíveis para responder. Nuwa estava.
As cinco flores referidas no ‘tsim man’, prossegue o adivinho, não são da mesma espécie, nem da mesma época. Há duas que foram plantadas juntas e ao mesmo tempo, apesar de uma ser uma flor de damasco japonês e outra de pinheiro. São mais antigas e não se dão com as que aí vêm. A saber: flor de pêssego, de ameixa chinesa e de damasco. Há aqui um confronto. “Estas flores não podem ser plantadas ao mesmo tempo, mas vão florescer ao mesmo tempo”, avisa Chan Kam Cheok.
O dinheiro resolve
Será exagerado presumir que as “três flores” semeadas mais tarde representam três novos secretários no Governo. O ambiente é de tensão, há rivalidades, conflitos e muita competição, mas mais na primeira parte do ano. Entre Julho e Agosto a situação deverá acalmar.
“Será a melhor altura do ano”, diz o adivinho. Foi nesta época, esclarece, que os três guerreiros Liu Bei, Guan Yu e Zhang Fei, as figuras históricas presentes no nosso ‘tsim man’, se tornaram irmãos de sangue. São um símbolo da lealdade fraternal e de união. Será também por esta altura que o Chui Sai On deverá confirmar a reeleição como Chefe do Executivo.
A solução para ultrapassar os conflitos dentro do Governo, indica-nos o oráculo, é já uma das marcas do actual mandato do Chefe do Executivo: “Gastar mais dinheiro”, aconselha o adivinho, que se queixa da falta de subsídios para manter o templo de Nuwa, que conta já com 126 anos. Foi construído durante o reinado do imperador Guangxu da dinastia Qing.
A ideia de “gastar mais dinheiro” pode ser lido com um maior investimento na cidade, já que a segunda parte da solução é fazer com que toda a gente conheça Macau – pela prosperidade económica, no melhor sentido da expressão. A combinação das duas ideias fará com a Primavera volte a ser o melhor de todos os tempos e que “não haja outras flores a concorrer com as que já existem”. A alegoria pode também remeter para uma estratégia de afirmação de Macau como uma cidade única no mundo ou, pelo menos, “diferente das outras”. 
* Com Iris Lei, Ponto Final, 5 de Fevereiro

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