23/01/2014

Encontro marcado na missa de Pangim

Inês Santinhos Gonçalves - Ponto Final, 22 de Janeiro 2014
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 São “portugueses de Goa”, filhos da terra que nunca saíram do país ou emigrados que regressam religiosamente para férias prolongadas. Encontram-se aos domingos, na Igreja de Pangim, para uma das poucas missas do Estado rezadas em português.
Num primeiro contacto com Goa chega-nos logo uma advertência: por aqui já são poucos e antigos os que sabem português. O concani, a língua local, e o inglês são os idiomas francos, a que se junta o hindi (língua nacional da Índia), perfazendo três línguas oficiais. Mas poucos dias bastam na cidade para o português, ainda que “mascavado”, como alguns o chamam, vir ter connosco.
Como em tudo, a sorte tem o seu papel. Na Igreja da Imaculada Concepção, conhecida simplesmente como Igreja de Pangim, o português toca o sagrado, todos os domingos pelas 10h30. É esta a hora da missa em língua portuguesa, uma das poucas realizadas em todo o Estado de Goa. Fica a cargo do padre António Xavier, que fala um “português mascavado”, avisam-nos mas antes de entrarmos na capela.
Cerca de 30 pessoas assistem à homilia e juntam-se à canção: “Tenho um amigo que me ama, tenho um amigo que me ama, seu nome é Jesus”. Na Imaculada Concepção faz calor e as ventoinhas que pendem do tecto de madeira giram no máximo. “Em nome do pai, do filho e do Espírito Santo”. Silêncio. As leituras seguem-se, por vezes nítidas ao ouvido habituado a outros sotaques, outras vezes nem tanto.
Num Estado em que o número de pessoas a aprender o idioma não chegará a um milhar, cabe aos mais velhos o exercício da língua e são eles que, ao domingo, não perdem a missa do padre Xavier.
No átrio da Igreja branco-cal, debaixo de um céu azul brilhante, vemos os fieis saírem aos poucos. Dois dedos de conversa com uma pessoa rapidamente se tornam numa reunião – em poucos minutos estamos rodeados por uma dezena de lusófonos.
A missa de domingo funciona como ponto de encontro. “É uma das formas de manter a cultura. Nós, os falantes de língua portuguesa, vamos também para o Clube Vasco da Gama, que é um outro lugar de encontro e lá tomamos bebidas, falamos e cultivamos a língua portuguesa”, conta Messias Pereira.
Como muitos goeses lusófonos, Pereira esteve fora da Índia durante a maior parte da sua vida adulta. Estudou “português clássico” em Portugal – orgulhando-se de, por isso, ter o português mais correcto de Goa – mas uma mudança para a Suíça obrigou-o a dominar o alemão. No entanto, manteve sempre “a ligação à terra e à cultura portuguesa”.
Agora, passa em Goa a maior parte do tempo, só dispensa a época de monções: “Nós, portugueses de Goa, que estamos espalhados pelo mundo inteiro, temos sempre tendência a voltar à nossa terra. E é uma espécie de pequeno convívio que nós temos, vir aqui à igreja matriz de Pangim”.
Também Óscar Monteiro, professor de Português e Economia radicado no Canadá, vai e vem. Viveu em Moçambique, Inglaterra, Portugal, mas regressa sempre a Goa. E agora que as obrigações profissionais o permitem, passa três a cinco meses por ano na cidade-natal. “Nasci cá e gosto disto, gosto de visitar amigos e familiares”, explica. O autor do livro de poesia “Nas asas da palavra” fala de um sentimento de nostalgia e das saudades dos sabores. “Uma coisa que não posso fazer no Canadá é a comida goesa, com os condimentos e assim”, lamenta.
Quando está em Goa, Óscar Monteiro dá frequentemente aulas de Português a convite do Instituto Camões. Apesar de o idioma estar longe de gozar da pujança de outros tempos, continua a marcar presença: “A língua portuguesa é ubíqua, está em todo o lado. Há instituições que zelam pela língua, uma delas é a Fundação Oriente, outra é o Instituto Camões, e também o Consulado Português e uma associação de ‘friendship’ da língua portuguesa. A Fundação Oriente e o consulado criaram aulas de português em várias escolas, como língua estrangeira”.

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